sábado, 6 de fevereiro de 2021

Deixai-vos descer à vala,

 





Deixai-vos descer à vala,

Deixem descer à vala,
O corpo que vos deram,
Deixai-vos cair, como as coisas
Que se partem, reles, usuais

E os argumentos enterram-se,
Deixai-vos senhorios, morrer na terra,
Como é natural, numa concha
Onde a areia se infiltra, na campa

Se entranha, velada estranha,
Igual toda a espécie humana,
Deixem-se descer comuns à vala,
Ridículos, mesquinhos, profanos,

Infra-humanos sem futuro,
Falsos Profetas, obscuros e ciganos,
Réus d’sua própria fama,
Como manda lei, norma,

Nada é vosso, nem o corpo,
Mas tem de haver alma,
O corpo é uma montra,
Fixo-me a ver se a vejo,

Fico-me por tudo isso, cinza
O que não tenho, o que era físico
Grotesco mundano, insignificante
Cor de sangue, excepto

O que não vos deram,
Revela o absurdo e o que não se explica,
E uma maneira especial, invertida de
Mágoa, mudas criaturas se velam,

Ilógicas janelas estendem-se em silêncio
Sobre campos, enterrados
Órgãos humanos, fálicos olhos, órfãos
De mãe e pai, universais os sonhos,

A razão e o conhecimento, o instinto
Não morrem, de modo algum se enterram,
Deixem descer à vala o corpo, comum
Simples, profano, refugo, peste…





Joel Matos ( 3 Fevereiro 2021)

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Permaneço mudo




Permaneço mudo, sereno e distante dum muro de
Medos, o ouvido tísico, meus olhos cegos
E o espírito chão, o Cã da idade das Trevas,
Pedra já velha, gasta, procuro auxílio, remédio,

Conforto, sinto minhas, as lágrimas da esfinge
Disfarçam a saudade das madrugadas, intactas
As manhãs, ao beijar na terra, a luz não
Da lua, das damas da noite, magras, emboscadas

Ou dos fantasmas da morte, silvando vagas,
Longas pegadas preces, velozes corcéis,
Vozes de ascetas magos, cavaleiros do
Apocalipse, é o fim do sempre, inquietante,

E eu permaneço mudo no pó, no caminho,
Como se obtivesse do céu a réplica de um hino,
Ao meu instinto, à minha imperfeição de ver,
Ouvir, pensar certo, nobre abdico do meu valor,

Renuncio de mim próprio, a vida não me convém,
Não contenho nas lágrimas o sal, os mares de veludo,
Nem a casta, que eu desejaria chorar, por esta
Imensa erma, extinta Terra, gasta rocha, penedos

Negros, negros cabelos, a Berenice dada aos
Deuses, sugerindo no ocaso, o fogo dos Gregos,
S. Telmo e a carícia das paisagens ardendo,
Longínquas, trémulas damas, belas e brancas,

Cal, de animal vestidas, cornos chifres, dançam,
Devolvem ao campo o sémen, o corpo, como pedindo
Expiação para o luto, perdão para tudo isto,
O ouvido tísico, os olhos cegos e o espírito mouco.




Joel Matos ( 01 Fevereiro 2021)

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Meus sonhos são “de acordo” ao sonhado,

 



Meus sonhos são “de acordo”, ao sonhado,

Deixei de ser tudo o que queria vir a ser, sonhando,
Fui sempre o que tentava e acontecia, o que
Fazia, o afoito, o herói para quem tudo é fácil,

Faltou-me apenas aquilo que esperava sonhar,
Fazer e o que não farei, nem está feito, sonhados,
Meus sonhos são rigorosamente de acordo o que o
Sonhado traz consigo, o que conduziu

Aos sonhos que tive, deixei de ter o sonho rico,
Expectável, o apetecível futuro dum monarca
Passado, na actualidade, sincero, real,
Preso a mim como um trunfo, um triunfo,

O objectivo principal da minha vida, foi
Sempre, não é de agora, o de alinhar
Hierarquicamente os acontecimentos,
Ao lado das ambições, foi aí que entendi

Que a dimensão não era a mesma, faltava
Tempo e a demora, a harmonia também
Tem peso, asa, assim como o recordar ter efeito,
Em proporções evangélica, na inclinação da

Cabeça, é um acto de humildade expresso,
Face ao que seria lembrar o que viria a ser
Se fosse feito anteontem manhã, ind’agora
Cedo, assim como o perdurar do que sinto

Face ao que tento vir a sentir faz tempo,
Por mim eu deveria ser, não o acto, mas o desejo,
O actor absoluto e não o contrapeso da emoção,
O palco do que terei de vir a ser, o risco expressivo

Produz em mim um sentimento dúctil, fóssil,
Muito próximo do acontecido que queria
Viesse a acontecer, se tivesse espetado os
Ombros para a frente do corpo e por cima

Do mesmo, fazia-me sentir que queria eu ser
“De acordo” o sonhado, sonhando eu acordo,
Acordado sonho-me dormindo.





Joel Matos (27 Janeiro 2021)

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segunda-feira, 25 de janeiro de 2021

A tenaz negação do eu,

 




A tenaz negação do eu,

Ideias ou acaso, avulso e acidentais
Como um vaso cheio meio de barro,
Que se vaza, sem forma pensada, insurreição
Ou o avesso, a ideia elevada de verdade

Sem que se altere a série de curtas noções,
E o que está dentro, génio, intuição
Ou simples tensão de conteúdo, colorida
De forças apostas, alívio das margens

Num vitral ou antagonismo apoiado
Em máculas, aos poiais da opinião
Dos outros, espécie de iluminura derrotada,
De asas podadas e da espessura do magma,

A tenaz negação do eu, alienada
Fruta que não matura, cai protagonizando
O invés ou apodrece na serenidade
Da árvore, o ácido e a acidez do vómito,

E ao mesmo tempo, num mesmo placebo,
Os vícios inaturais da pera, dura e impulsiva
A “ilucidez” da conversa comigo mesmo,
O futuro torturando o presente,

Tão falso é, o suposto ser “a sério”,
De verdade, pobre infeliz sou eu,
Que me surpreendo a ocupar espaço,
A concorrer com a existência livre,

Se me sinto, nulo, estéril, plano
Como atmosfera, liso e sem personalidade,
Incerto de tudo, da fórmula orgânica,
Para me transpor do interior das córneas,

Com a força íntima da garganta, acidental
O incesto com o absurdo, eu próprio
Bastardo do negado indulto, obrigando-me
A ler nos próprios lábios, ideias ao acaso

E avulso, a auto negação do eu …




Joel Matos ( 25 Janeiro 2021)

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Tiras-me as palavras da boca




Tiras-me palavras da boca
Com alfinetes de dama, agulhas finas,
Tenho a maldita certeza e é
Como se estivesse vendo, sair
Uma a uma, sinuosas lentas, dançam

Numa espécie de bailado cósmico, dóceis
No movimento, confortam-me, deslocam-
-se, vejo-as cruzar a alma, adiante do
Meu fôlego, nas coisas que digo, faço,
Falam por mim e de mim falam, clamam

Eloquentes, nem necessidade
De existência viva, sonhos são
E sempre, passagem para outras
Vidas existentes, inexplicáveis
Pra gente,- arquitetos com corpo-,

Se eu pudesse explicar o que vejo,
Saindo da minha boca, talvez fosse
Como ouvires música vinda de outras
Dimensões e a mesma emoção bem-vinda,
Sensação de Terra, externa ao ouvido,

Tiras-me palavras da boca, sonhos
Inesperados na primeira fila, fábulas
Depois absurdas falas, ilícitas, caídas no chão,
No fim retiras visíveis imagens,
Que me convenci saírem de mim,

Mas não, sou eu de mim partindo
Trespassado a alfinetes, toda a voz tem
Um fio, o fim é quem me ouve claro,
Exterior ao ouvido, uma a uma
As palavras que retiro da boca, sonhos

Enfim ausentes do corpo físico,
Outros mundos a roçar por mim e eu todo,
Espécie alguma viva tem destes sonhos
Em que nada pesa, tudo balança
Sinuoso e lento, alheias e nem tanto,

Tiras-me da boca as palavras, nem todas,
A impureza é uma casta e o meu solo
Fértil, na boca faço asilo, das palavras
Mais fétidas às que desobedecem e têm
Severo castigo fora deste covil de asceta …





Joel Matos ( 23 Janeiro 2021)




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O lugar que não se vê ...





O luar que não se vê,
Ora m’afaga ora m’ lembra
Do Sol a sombra, tom
De cinza negra, morto
Na senda da deusa desnuda,

O lado que se prevê, o assombro,
É como um íman, o imo, o hino a “Lugh”,
No íntimo fundo de uma longa,
Imensa cripta, o céu uma escada
Sem fim, rolante, magenta e caliça rosa,

E o tutano mármore, rio mudo
Surdo e frio, cobre o pulsar
Do espaço como leite, veneno
Da deusa Terra, melaço
De lua laça enlaça, prende

Por vontade, anula, encanta
Fragmenta, escuto-a,
-Ciente ilusão de morte,
Que não assusta nem se
Rejeita, falsa é a sorte, a fé, a fama,

E o destino uma clareira, um forte
Em ruínas, um sepulcro chão
E um guardião coberto a receio
E a negro, me vela, falso Pã,
Dissimulado, oculto na lama,

Não vá despertar eu da morte
Em qual noite exótica, estranho
Abrir de portas, o sair do espelho
E voltar prefeito do profano, do luto,
Do lugar que não se vê, inumano,

Gerado mudo, sem narrador
Nem conto. Este o mundo do fim
De tudo, tenebroso pálido e feio, uso
O manto régio doutro Rei, deposto
Senhor de tudo, morto, esquecido

Vencido e arrastado por léguas de rojo,
Do altar nas cruzes, até à penumbra
Cinza negra, cujos subúrbios habito,
Não abdico da realeza dos mortos, do hálito,
Nem da anatómica máscara, que deles uso,

O lugar que se pressente …




Joel Matos ( 19 Janeiro 2021)




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Esquema gráfico para não sobreviver à morte …

 





Esquema gráfico para não sobreviver à morte …

Por mim, e de minha parte, dispenso-me de comparecer perante a morte tão cedo e em tão solitário lugar de culto, de parecer bem no dia a dia, no concavo do espelho enquanto vivo e me vejo e do acontecer matemático, geriátrico-sistémico, cronológico-depurado complexo, pareço-me e comungo do comum entardecer dos Generais da Roma antiga, dos Reis do Egipto, mas sou apenas um comum acontecimento já acontecido, falo do que ocorreu anteriormente e se sobreviver incompleto e segmento, parcialmente, já não necessitarei de levitar e inventar o da voz demasiado grave, de voar levantado ou levantar a fala até mais não, até não poder mais, não precisarei de precisar mesmo, nem mais de mim, sorrio sorridente – sorrirei ao de leve, senhor do isolamento e da distância, da duração esclarecida do meu tempo presente, inebriar-me-ei de poesia, essa poesia inerente, pressentida, valente, densa e à flor da pele, que só dói se estivermos dentro dela e perto, bem perto e em pelo, o quanto baste para ser uno com a minha dolorosa e sentida forma de suicídio terrestre, tal a inverdade que me rege e pratico.
A tentadora validade gestacional do poeta, só é válida, só e apenas se constrói de uma vez em todas as possíveis e somente aos poucos e a poucos se congrega e se consagra, do desassossego na fala, a tantas outras razões nos cabelos no “pão-de-rala”, por tantas outras ocasiões razoáveis, quando nos mostramos nós mesmos falhos, folhas de lógica sem validade, fora de prazo em mil e um ou mais socalcos soalheiros e vitalícios, vinhateiros da ira em época de colheita, não depois, durante as chuvas e os aluviões, perante as secas, nem antes de reapresentar em lugar algum, cestos cientes, cheios de dúvidas, nessa altura sou eu mesmo e um mais, mágicos agnósticos e brilhantes como a geada, ideólogos da cevada, puro malte quanto a agua irradia de bom grado, o brilho de um regato cristalino, a montanha por descobrir, encoberta de um lado, assombrada por um negro lago, profundo, onde não medra nem fogo, nem um fungo nem pasto, nem uma perca do nilo, um rodovalho, um robalo. Por mim, sou o analgésico mirabolante, a miragem de qualquer substância a mais e de mim mesmo antropólogo crédito, amais valia não passa de algo análogo a isso, depois impregno-me de uma mistura mística e pessoal de ilusão estética-profana profunda, falsamente endémica e monogâmica. Pois sim, o destino não dura para sempre, a submissão ao tempo que sobra, é uma inglória lápide negra e não unicamente ou exclusivamente uma prisão sepultada, abducente da lama, da areia, na praia do desconhecimento descontente, gradual e gráfico. Por mim, sinto, que a diáspora do arredondamento dos sentidos, a metáfora do nascimento, foi produzida unicamente para mim, a pensar em mim próprio e feita do mesmo e grave tecido de que eu fui e sou composto, produzido num tear sem linha nem fio apropriado, porque eu nasci descalibrado, desarredondado, arremedando os outros e morri quando encetei, no momento imediato, fatídico, fálico na altura certa em que comecei a copiar-me, iniciei-a transcrição, a imitação gráfica de mim próprio, o liberto e a permissão são de minha única autoria, embora não sejam plenamente, e o conflito frásico, hemorrágico, a antropofagia fraseológica das minhas próprias partes moles, mais discretas e nobres, hemorroidas de escritor condenado por delito comum, à morte por sossego e por sufrágio universal dentro dele mesmo, o análogo, não dos outros como parceria ser normal e servir de exemplo para “o fora de mim” um diferente lugar do quiosque que ocupo dentro de mim próprio e presentemente, fora da atenção do corpo, mais perfeito e prodigo que o “eu” ao cubo, num emergente esmiúdo de mim. Por fim o romance, a novela intensa, essa não teria argumento, caroço ou enredo nem ação, passar-se-ia apenas na minha cabeça de maçã, na mente de broca, ou na de quem a escrevesse melhor que eu e a intriga seria entre o espírito e a consciência, a intuição consistente e o Arsénio, O “LUPIN”, o enigma que liga os personagens como figuras reais com o escritor fictício , o criador figurante, galã de conto de fadas, das fábulas, ele próprio um personagem secundário, operando débeis canelas, entranhas e cabelos disfarçado de outrem, intuitivo na tarefa de fazer cumprir escrupulosamente um guião e o maior sabedor do conteúdo geral e integral da peça e do meio metro de palco, o sábio do labirinto gráfico e ancestral e o que sonhou ou o que conhece a saída para o outro lado do cosmos, da Galáxia, do mundo cabal e global.
A primeira edição da minha vida será por fim escrita, descolorida e desenvolvida com a ideia de não ser entendida nem por um qualquer psicótico ser de vista turva, com a ilegibilidade rara do que me é mais caro, sem cura, remédio fracassado de óxido de mercúrio e reagente mais calado que o silêncio em minhas veias colados sob pele fina, mas de que vale uma biografia, uma vida sem historia de medo em que tudo pode ser dito e ser tido como superficial porque normal é humano, é o senso comum e não de mim só, o labirinto que me habita, sonho é geral e genérico como a febre do sol e o paracetamol ou o fim do ano em centos de diferentes cidades do mundo mas comum e expressivo para quase todos afinal. Por mim, e de minha parte, dispenso-me de parecer bem, carismático ou altruísta, mundano comigo ou com qualquer parte do meu corpo, incluindo as partes moles da barriga e nos gânglios infectos (…)





Joel Matos ( 18 Janeiro 2021)

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sábado, 2 de janeiro de 2021

A simbologia dos cimos





O principio e todos os lugares, a gnose dos dedos
São os meus dez medos cerrados como rochedos
Abertos os da mão grossa com a outra, a leve, ingrato
O gesto colado à boca, assumo o que digo, gesticulo

Outra conversa, pois é comigo que me estou sentando,
Ou estava, correcção dos meus falsos ecos, dizendo
Do que fui antes, era quotidiano, sem espaço quanto
Tudo o que faço, a diferença entre mim e eles, dedos

Falantes sim, pois só os leves e o livre voa sem peso,
Sou ambos, neste caso o voo plano dos sem jeito, leões
Com os pés dobrados num cepo tosco de faz de conta,
Pau de madeira, pobre e seco, actor, cão pisteiro,

Figuras que eu próprio crio sem êxito, irreais quanto
Eu mesmo e na mesma proporção dos cimos través
Dos quais me acrescento por aproximação ou defeito,
Pasmo perante a estranheza com que desejo o manto,

O abstrato, ainda que com consentimento, mais que por
Volúpia em excesso, digo de mim para mim até me
Convencer do oposto, que é não estar em meu poder
Alterar o ruim e o grosso, o fraco em falangista canalha.

Clandestino, é como me afiguro perante o universo,
E nem a fantasia me desliga, do vulgar substantivo
E da arte decorativa, evocada por cegos da cabeça
Aos pés, sincero malabarista, dez dedos mal situados

De cada lado do corpo, equidistantes uns dos outros,
Equilibrando todos os locais, o mundo que conheço,
Corrosivo, gástrico, florescente em ácido abdicante,
Mas meu princípio e fim, assim a Terra e esta gente.

Princípio meio e fim …



Joel Matos ( 31 Dezembro 2020)

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Por um ténue, pálido fio de tule

 



Por um ténue, pálido fio de tule



Em cada dia que me aconteço, suspenso,
Nimbo d’mim mesmo, me convenço que os
Símbolos têm alma própria, a vida é breve
E os fios, enigmático tecido e pele
Como sejam de um genuíno ser vivo, aviso

Num ritual iniciático, conduz-me devagar
Igual a linguagem de espíritas, em lume ocre
O que fica cerzido, o oráculo dos mortos,
A razão das coisas vivas, siglas em seda,
Da existência, do fim ao começo, profecia,

Entendimento, uma presença no limbo,
O juízo do cosmos, as cordas e o espaço/
Tempo, o privilégio da alma, cifras são caules,
Rituais de visionário quando Omega antecipa
O Alfa, a linguagem do Indo, de quem

Não possui corpo, aspecto, uma Sibila
Sem focagem, imprecisa e ténue, singela
E dispersa no ar, toca-me e sinto-a tocar-me,
Entra por mim adentro, sedenta, desconhecida
E sem pedir licença, por direito natural breve

De “quem-me-dorme” e me acorda, ao-de-leve
Por um ténue, pálido fio de tule, convida-me
Em sigilo e silêncio, depois nada…mais nada
E nada mais foi ou será visto, pronunciado
Por esta boca, este lábios, estas pálpebras.




Joel Matos (15 Dezembro 2020)

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Epistemologia dos Sismos





      Epistemologia dos Sismos

ou  A simbologia dos símbolos



Eu queria ter tido dos outros, a forma,
Numa frase escrita, num fragmento
Curto, numa memória circular, um registo
Que não o meu discurso descrente,

Em que me descrevo, não como
Um semideus nu e cru, mas parecido
Aos quais queria ter sido, os outros, mais
Fácil imaginar-me perpendicular, um fuso

Por uma questão de entendimento do prumo,
Do que seguir a linha obliqua de um ovo,
Direi eu divino, não por uma questão
De humildade mas por escrúpulo, zelo

Por mim próprio tão pouco, ao ponto de me
Curvar como vime perante a inverdade
Alheia, é como me descrevo diante
Da alcateia, sendo eu próprio o super-lobo,

O dragão do éden, o ovo parabólico, o sino
Das sociedades secretas, resolvo partir
À descoberta quando o manifesto sou eu, etrusco
Semicego, somo e sigo, evoluo pelos medos,

De modo que não me rache em mais a alma,
Partida entre mim e os demais, que nada fazem,
Como memoria a definir, pó de s’trada, estorvo,
Evoco-me ao morrer com a humilde felicidade

De nada ser, quando sou tanto e tudo mais
Que o divino ciúme pode sentir duma só criatura,
Num ser gigante com dimensão de um ovo,
E ainda digo que “queria ter sid’os outros”,

Menores que eu sou, realmente falando
Do ovo na sua curvatura perfeita e do
Prazer intimo que tenho hoje, quando me
Descrevo e declaro general “do-que-sinto”

“Ao-de-cima”, no cimo do píncaro, nas torres
Dos címbalos, da simbologia e dos símbolos …





Joel Matos (13 Dezembro 2020)

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Não passo de um sonho vago, alheio




Não passo de um vago, vulgar desejo
Com a ideia de ser “de-verdade”
O ar que respiro, o luar e a luz sincera
Do dia, tudo o que sonho, tudo

O quanto eu seria se acordasse do
Aquando dormia um normal, leal sono
E a expressão doce de levar comigo
O que me trouxe me seguindo, desejo

Toda uma realidade dobrada em dois
Que me mereça e não, não porque
Estou pedindo que esta me aconteça
De verdade e dum todo, perco-me

Num bocejo que me impede de agir,
Absolutamente sem vontade e dormir
Será morrer de qualquer maneira,
Porquê acordar sem vontade, objetivo

Ou facto que me trouxe, me seguindo
Agora pó, sombra que me transporta,
Fala do vento na copa do pinheiro,
Não passa de um vulgar bocejo,

Pela mão de quem me arrasta, já sou
O que nunca fui, serei semelhante
Ao céu e à terra, igual ao dia, ao sonho
Sem deixar de sê-lo, vulgar e belo,

À luz do dia, nada disso faz sentido,
Consciência será o não sentir, pensar,
Toda a ideia será verdade e o respirar
Inimigo, o ausente da vontade, o supor

Estar sem estar “de verdade” vivo,
Quando não passo de um vago, vulgar
Anseio que comigo tenho, sendo eu
Quem me transporta a algum lugar dúbio,

Em que tudo, nada tem de meu, a floresta
Que tomei por caminho, o que de mim
Sai e na alma se faz, o silencio a paz,
A luz calma e o meu destino que dança,

Passa estranho, alheio, estrangeiro…




Joel Matos ( 08 Dezembro 2020)

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Cumpro com rigor a derrota




Será minha a minha vida ou roubada
A outros, às sombras, o destino que
Me é dado acreditar e me cabe por
Direito, cumpro com rigor a derrota,

Sigo o resto que a maré deixa de lodo e
Sargaço na areia assim os meus sapatos
E o musgo em carpete sob meus passos,
Que o não os sinto nem ligam meus pés

Ao sub-mundo que me consente apenas
Passadas pequenas em minúsculas, rústicas
Pernas, inútil vida de sombras eternas
Roubados os mortos, perpétuos e terrenos,

Será minha a minha vida ou é simples cinza
Doutras vidas e de quem já viveu e a
Água do meu lavatório, sangue e urina
Que Orpheu verteu no covil do Demor-

-Gorgon. Diz-se que depois de extinta
A cinza não gera fogo e a Acácia não
Floresce de novo em tom amarelo sem
Repousarem um inverno e as folhas, troncos

Nus e despidos, áridos como a minha paixão,
Ardido meu peito e a crença que não sou eu,
Nem me conheço, sendo minha a vida
Esta não me foi dada, sou um arremedo

De outras, idas numa sucessão de sombras
Tão sombrias quanto o escultor cego e surdo,
Que as talhou num panteão que não é meu,
Num poço profundo, longe dos crentes,

De todos e de tudo, não longe do “cu-do-céu”,
Cumpro com rigor a derrota espiritual, digo adeus,
Como cada homem que a vida deixa no caudal
Dum rio sem barca, num mar sem margem …




Joel Matos ( 05 Dezembro 2020)

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Perdida a humanidade em mim





Perdi a humanidade,

Perdi-me da humanidade, não me posso achar mais nela,
A crescente nitidez em mim é igual a um um azul sem cal,
Olhos de perdiz em que os sonhos não se perdem, 
Acrescentam o que vi em vida, vejo que me perdi desta gente,

Me perdi da humanidade e de tudo quanto fui e sou, agora nada 
Me pertence, nada me vence, nada me acaba senão o despertar 
De vez para cento e uma mil formas de ser que não havia
Em mim, isso me inclui sem dúvida num céu que perdeu o tom,

Deixai-me ouvir intenso o que não posso ver, o que nunca sonhei, 
O meu próprio ser outro, não ter pensar como raiz d’pedra greda, 
Desejos inúteis são pesos, vulgares apêndices, fálicos pesos
Ou fábrica de fúteis contas de efeito hipnótico em embalagens

De realidade em formol que não têm espécie alguma de sentir, 
Nem nenhum elemento espiritual essencial, desses sem peso, 
Nem preço, nasci para criar o que outros talvez não entenderão,
Estados de alma, projecções de ideais abstratos, ilúcidos,

Embora nítidos, todo o esforço foi em prol de separar-me 
Do que sei e do que se ergue diante do meu passo de vista 
Curva, visões e desarrumo, enquanto eu legitimo o céu 
Solto, depois de retirados os castros e eunucos castelos

De praça quadradas e antigas, grandezas provisórias, 
Sem alma, semelhante ao som de veículos de ferro 
Chapa e solda, esquadrões da morte de um exército inteiro, 
Desertado, coberto de alcatrão viscoso e palha solta, pregos, 

Perdi a humanidade, o andar é um esforço em falso 
E pode ser que nada valha, sei que  ainda não é o fim 
Nem o princípio do desencanto, o mundo, é apenas tardio,
Os lusíadas um conto, Inefável é o que não pode ser dito

De verdade, Nem na sucessão dos deuses haverá Híades, 
Princesas como promessas por cumprir, tratados “mundis”, 
E esta humanidade sem comprimento nem encanto,
perdi-me da humanidade e de tudo quanto fui, agora nada sou,

Nada me pertence, nada me vence, nada me acaba,
Perdi a finalidade “ao-que-vim”, Perdida a humanidade
Em mim …




Joel Matos ( 04 Dezembro 2020)

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quarta-feira, 25 de novembro de 2020

Vencido

 



Vencido


Quero saber se realmente s’tou vivo
Ou deixei de existir sen’sequer notar
Ter vivido, insignificante levito
Morto, imito como o abster da luz dos astros

Menores que rodeiam Saturno e Uranus
De cores desmaiadas, limadas luas de gelo, frias
Mesmo à luz parada do meio dum dia d’outono
E para sempre, sempre por mais um ano,

Vivo o desejo de infinito que suponho comum
De viventes reais e no qual nem acredito nem
Se hei de estar realmente vivo pra sempre
Na semana-que-vem, nem que seja pra

Morrer apenas por vontade própria em acta
Mas “de vez” e como deve ser na morte
Um certo curto, lúcido e estranho convicto, preso
Em mim próprio pro resto desta vida

Vivida em oito passadas de trinta cinco passos,
Porque não sessenta,  sendo doze  os meses
E as frágeis fantasias presas a mim, como
Marcadas impressões a dois tendo nós ambos

O mesmo comprimento em altura como
Na largura a silhueta dos ombros que
Nos projecta deuses, neste sótão bera e chão,
Tão contraditório eu sou, não diria diferente

Porque não o sou de toda a gente, embora
Vida pareça vida sendo minha de início
Compartilho o desatino de outro, um morto
Sonhando-se vivo, insolvente de sensações,

Vencido.





Joel Matos ( 25 Novembro 2020)
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segunda-feira, 28 de setembro de 2020

Esquecer é ser esquecido

 






Esquecer é ser esquecido e saudade a substância do vidro,

Um adormecer em forma de dom, em que consciência
E apego são bastardos naturais de uma mesma escara,
Nascidos no ventre uma de outra como tumores, abscessos
Malignos, ambos com igual instinto, cada um nega
Parentesco e origem, coisa triste o’dormecer da vontade,

Confesso a indiferença, sobrevivo nulo perante crenças
Fuinhas, confundo a porta dos fundos com a plateia,
Sendo eu próprio escalador de vácuos e espectador
Assumido de mim mesmo, que o digam os acenos
Sem conteúdos, as palmas de despedidas, mas eu atuo
Como um deus seminu de brilho, não suporto fingidas cenas,

Sou opinativo do tutano à nuca por não ter certezas
Concluídas nem nunca um modo de ver tão simples
Quanto o espectro da candura, sou por direito absoluto
Monarca como fardo, e um tísico embora o meu espirito
Seja dono do mundo por não haver outro, tirando este
O qual amo mais que tudo, esquecer é ser esquecido,

Nasci liberto de domínio e é assim que serei, desprezo
Tiranos altivos como proas de navios decretando quem
Morre e quem fica perene, embora cacos de lembranças.
Tudo é poesia, até o que se esquece, acontece-me às vezes
Esquecer aquilo que não quero e concluo ser alergia
Ao que suponho querer e não me faz falta nem quero,

Esqueço em homenagem a mim próprio e ao absurdo
Ensejo que é ser suposto facto e não ciente realidade,
Qual ritual duvido de coração e alma. Agora é pra sempre,
Fui descuidado na seleção do que se esquece, esqueci
Ainda ontem a utilidade como se fosse uma derrota
E a saudade do que hei-de ser eu não, a ilusão do sonho

Ou o trinfo da morte concreta, o crepúsculo não se
Mede, nem é uma ciência, do meu coração às vezes
Duvido, mente-me acerca de um régio destino e eu
Indigno do que creio ter, um raro instinto de poente,
Saudade é gente que o esforço não apagou e a maioria
Vive em mim, ser esquecido é esquecer, escolha-visco.

Admito tecer por dentro uma teia com fios de vidas
Que mais parecem sonhos de vidas que não tenho
Mas conheço ainda que doa não ser eu um outro ser
Menos fragmentado entre consciência do desapego,
O chocolate e a cereja, o paladar da estranheza,
O prazer de ser esquecido como manifesto à indiferença,

Encaro-me com o desapego que tão dolorosamente
Represento a sós comigo, chamo-lhe de “necessidade
De me sentir vivo” essencial à falha de que me rodeio,
Sem que me aperceba não sou eu, mas um outro eu,
Semelhante a mim mesmo e enfim esquecido,sobejo  …



 

 

Joel Matos (Junho 2020)
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Pra lá do crepúsculo

Pra lá do crepúsculo Deixei de ser aquele que esperava, Pra ser outro’quele que s’perando Em espera se converteu, alternando Despojo com eng...