quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

Carta a "uma Poeta"



Cumprimentos Poéticos…Lídia, meu amor, minha ninfa…

Dirijo esta carta a “uma poeta”, ou duas… ou três… (ou todas) e designo-as de poetas como ao feminino de professores e adivinhos chamo de professoras ou de adivinhas, adivinho algumas poetas que partilham do meu subconsciente, delas nascem as minhas mais belas invocações do parecer real.
Possivelmente lembras-te de Psyche ou Annabelle Lee, encontrávamo-nos num jardim perfumado por narcisos e perturbado por sombras sem nome, povoavam os nossos sonhos comuns, uma algaraviada multicolor de místicos míscaros e, não sabendo quais escolher, que não nos provocassem morte imediata, confiávamos cegamente nas negras máscaras, das virgens nuas que se perfilavam nas nossas consciências incomuns.
Foi com um intenso prazer que as li e reli, imediatamente surgiu em mim uma vontade grande de lhes prestar homenagem, pelos seus escritos cheios de sonhos e estética poética, ambos sabemos misturar os sonhos e a vida sem destrinçar qual duma é a realidade e o sonho das outras e então viajamos de uma forma indefinida, dividida entre a noite e o dia, o Sol e a Lua, os canteiros de flores que pisamos, só os trilhamos por não haver outro caminho, nem volta a dar ao jardim da originalidade irreal.
Partilhamos uma gaiola em éter, do Éden e da promiscuidades sem férias e não deixamos de ser escravos de um espaço fechado, só varia o facto d’o pensamento comum cavalgar obstáculos, o que nos distingue doutros pretende ser a originalidades e não a oportuna pertinácia (tão pouco definíveis ambas),
Dizem de quem possui essa ingenuidade, (falando baixinho no barulho da cidade) ter da verdade todos os favores mas na verdade apenas mudam os discursos que debatemos connosco por falta de interlocutor, para alguns estranhamente sinuosos para outros, engenhosos beijos aflorados de palavras e contextualmente exactos.
Sinto um estranho arrepio percorrer-me a pele e os membros a cada segmento de frase nua que leio, como se nem fosse minha e nem concorrente, a corrente de ar parece quasi-perfeita e feita da minha irrealidade virtual, concebo a previsão do impossível e isso faz-me pensar nos que possuem na paz a abstenção de pensar.
A chuva quando caía no cais era de uma obliquidade vertical e contava as viagens de um antigo viajante por mares de antigas terras, dizia chamarem-lhe Ozymandias “Rei dos Reis”, essa narração bastava para que as ondas se metamorfoseassem em dunas e os navios em caravanas, ondulando pelo limite visual do areal e da utopia.
Lembro-me dos teus olhos brilhantes e claros como lagos de água doce onde me banhava nu de preconceitos como antes de viver.
Aí os barcos eram de papel-maché, diferentes dos barcos que do cais via entrar e sair devagar, paquetes abalroados e ferryboats atarefados em não fazer nada, mas parecendo que trabalhavam.
Éramos de uma clarividência quase divina Annabelle, Psyche e eu corríamos, riamos e divagávamos, Ophélia sentada no banco de pedra esperava, …esperava e contemplava o mundo e o vento dizendo-me ao ouvido… viver é preciso, é preciso viver para provar que somos sublimes, a razão é um apêndice alimentado pela vista, há que manter as janelas limpas para apreciar os lírios e os campos, os delírios de cada recanto do jardim das Hespérides.
Nesse tempo trazia dentro do meu coração todas as ilusões do mundo, estava farto de ser órfão de um só Deus e dediquei-me a Pã num mar de outrora dentro dum oceano do rei Salomão.
É um prazer revisitar o mesmo local da minha infância confusa, o natais e os novos tempos também para mim se transformaram uma fonte de frustrações, confusões e outras palavras adicionais terminadas nas tradicionais "traições aos Deuses"
 Uma das boas coisas que recebi em toda a minha vida foi o teu apreço, com os teus sempre admiráveis elogios, Lídia (penduro-me neles durante algumas semanas de forma a me sentir fortemente recompensado ou antes, a não me sentir ignorado)

Dizem por aí que não entendem muito bem o meu discurso, eu também não, muitas vezes mudo de sentido porque enquanto redijo, vou interrompendo o  curso de pensamento, umas vezes voo roçando pelos atalhos do pensamento outras vezes perco-me porque começo de dia e acabo dois ou três dias ou noites mais tarde,mas noutro universo, não muito paralelo.

O meu muito obrigado Lídia, ainda bem que consigo cativar o teu interesse pela minha escrita à qual me refiro como "poética" mas falta-me inventar um "estilo" menos pessoal, não tanto “Pessoano”, mais meu, escrevo muito ao sabor da conversa mental que debato comigo mesmo e com o Outro eu,  pouco impactante mas não somenos importante. Foi a tua capacidade de apreço sem retorno que me influenciou e definiu o  fio invisível que segui desde a teia, tu foste a primeira invenção dos meus simples escritos.
Leio pouco mas considero os poetas bons vizinhos, deram-me a conhecer Keats, Shelley, Poe etc, Mas não ponho de parte a ideia de mudar de casa para subúrbios menos nobres; idolatro-os, sim… mas tenho de “pôr os pés à estrada” e encontrar a rua do meu bairro, o meu pessoal labirinto.

Tenho um medo horrível do fracasso, posso falhar já amanhã, poderia ter falhado ontem, não importa quando, sempre tive medo da derrota, talvez por isso esteja aqui sentado no fundo de uma loja ceifando filamentos do nada, entrar nesta casa e fazer todos os dias os mesmos gestos é fácil para mim, fazer diariamente o mesmo trajecto num engenho entre a casa e o simplístico trabalho é a base quase plana para quase tudo o que sou, quem sabe se a minha quase sensibilidade depende da estúpida monotonia e do que leio, e do que quase faça no dia-a-dia.

Ontem estive dialogando literalmente com o meu cabelo, este respondeu com desdém, dizendo:
- Como é possível que não tenhas medo de montanhas, do frio, de te isolares durante semanas a fio, longe de tudo e, no meio da multidão te sintas um atado cidadão, um citadino homem-anão, um homem “mais-que –fugaz” ?
Fiquei sem palavras e lembrei-me d’outro extenso diálogo que mantive enquanto encostava a boca a uma “canilha” de chá-mate e folhas de coca, nos Andes Peruanos sob o suor do sol e das lágrimas circulares da lua.
                                                                                                                            
Disse-me nesse dia o fecho-eclair do casaco de penas que usava sobre o peito contra o frio agreste, disse que eu exagerava nas mensagens para esconder o nada já que ninguém entendia nada e assim não seria necessário esconder o nada e esperava mesmo que jamais entendessem, já que não teria mais nada,mas nada... de meu para proteger por dentro, detrás do fecho.
Para seu bem, por estar frio e por ter abusado do direito de me criticar, tive de fechar imediatamente o fecho do peito e outros.
Continuei depois, conversando com os búzios e fechei os olhos.
Se dirijo esta carta a uma poeta é porque houve um tempo em que a minha janela estava aberta e exclusivamente reservada a elas (poetas), volteavam como se uma fossem, eram mais de dez mariposas e via-as a afastarem-se, devagar…devagar, agora sei que jamais existiu ontem ou amanhã e serei eu que voarei através da alucinante lucidez delas.
Em breve deverá chover.

Joel Matos (01/2011)

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segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

Tenho saudades de quando ignorava que havia mundo…


A chuva parecia à pouco determinada a destruir tudo,
Corriam pela rua com um furor apaixonado, o universo e ela.
Cabe entre mim e ela um vidro e um cortinado, diria que o veludo
Abafa a minha inveja, num aconchegante conforto de cela.

Tenho saudades de quando ignorava a chuva e ela a mim,
Hoje, afoga-me em ciúmes sem cura e do tamanho do universo
E não tenho mais a ilusão da’squina, ser a aresta d’algum jardim
Imenso, esconde-se no sonho dela o meu conceito de extenso.

Consumo na inveja o detrimento das outras sensações,
Como viajar ou ser lembrado, como um homem do mundo,
Entre mim e a chuva havia um milhão de códigos, cores
E sinais citando “Carlyle” e Entepfuhl, a estrada do fim do mundo.

A chuva parecia à pouco determinada a destruir tudo,
E eu aqui sentado vejo-a partir, sem destino, com a lua cigana,
Sou um mito de natal, madeiro sob o cobertor escondido,
Não tenho mais o delírio da chuva, nem de humano a sanha.

Tenho saudades de quando ignorava que havia mundo…

Joel Matos (12/2010)
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terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Nego que seja Arte

Platão e a rectorica 

Que se dane o sonhar de dia, se o semblante do subúrbio sem face
Marcasse o dia do meu desterro num obelisco tremendo, um mistério me cercaria de dia,
Assim um muro me cerca de noite, o sonho afoita-se na frecha greta o dia todo, tod’o-dia-a’fora
Porque minh'alma não partiu, ficou no corp'i'ruíu, ruindo, rindo constantemente de meu desalento
E se hoje acordei em prosa foi porque os ecos se foram, dos sonhos, morreram…
Porque as lágrimas de súbito secaram e das alas saíram
Pétalas e acordaram súbditos sentimentos  do que eram, subterfúgios  
Inconsistências e prosas incoerentes, sem arte.
Dane-se o sonho, dane-se o dia, Se há-de vento o que há-de calmaria
Há-d’a ser noite o mesmo que há-de ser d’ dia, de noite os meus olhos são palcos do que imagino
De dia Iludo-os com irritantes aplausos e fecho-me de fechos eclair p’ra não entrar luz da rua
E gritaria que me destrua.
Dane-se o agreste frio celeste e a peste se os nossos corações de tão altos...sem quem os alcance,
Caem em cacos...como se de louça fossem, daquela que se parte, mas ainda que minhas vozes não rachem mais o público, que se fartem das minhas postulas Rugas e tracem um subúrbio na face, as minhas pálpebras fechem no final cadafalso,
Do que ficou escrito e dito nego, nego que seja arte…

Jorge Santos (12/2010)

sábado, 18 de dezembro de 2010

Flores Indizíveis



Há flores indizíveis, da mesma cor da minha sombra,
E quando as descrevo, são elas quem m’alembra,
Que não tenho, nos olhos a mesma nitidez
Do girassol, nem a solidez do chão, em que poisam cardos

Ou nas veias, a acidez da planta alcalóide,
Apenas partilho, com a natureza, a vontade
De me fazer dividir, pelos sentidos vasos,
Se bem que não ache, a porta dos humanos

Órgãos e entrar na pele deles, (Homens) é bem mais difícil,
Teria de pesar o juízo certo, ser d’eles uma indivisível ideia,
Com’um sonhador falso, entre tantos, sem fantasia
Nem assombro, ignorar a cor d’minha própria sombra,

A sombra das árvores ond’habito próximo.
Há flores invisíveis e com elas tanto me identifico,
Que, quand’as ofereço, esqueço que é o meu próprio
Sangue ou veneno, que perco em quanto escrevo.

Joel Matos (12/2010)
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sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

O fim dos tempos



 -Fazem-me faltas as mutações de palavras montadas em esconsos alicerces dominando Babel, 
Do tudo ou pouco que li não entendi nada, talvez porque não fosse eu suficientemente intenso e apaixonado no íntimo, mas a leitura que fiz foi de único sentido e transverso, entrou mas não saiu potente no papel, (escrita algo ambíguo que não vos era destinado), e que ordinário envelope sem remetente encontrou em mim! -Sem a fórmula alquímica equivalente ao ácido realístico.
  Fazia-me falta a inacção mansa, inesperada e o balanço harmónico no silêncio suspenso para não me encontrar em cada frase pronunciada e em cada crepúsculo, contorcido de desconfiança da rua deserta e medo da alienação e de todo o vivo quarteirão da vila, do arrojo e da vulgar opinião e depois ter de falar por falar do insucesso, do parentesco que cultivo com ele e com o meu umbigo despropositado, também da saudade do nada (dizem sempre vem repetida em porções ou e em bruto), á toa quando se grita em tom mudo ou falar da sonora chuva que não cai porque se esqueceu onde morava a poeira.
      Fazem-me falta a erupção e o abismo Estremo … abrupto e que antecede o estrondo da queda de um anjo no inferno, presto homenagem ao aborrecimento, ao esquecimento e á erudição, pela falta de esperança que encontro na extinção de facto.
  Faltando-me a limitada coragem pouco mais me acompanha na queda, talvez na atenção que dispenso á paisagem eu veja um desejo evoluindo discreto dessa viagem pouco concreta, admito fazer algumas confidências mesmo quando estas deixam de ser confidenciais se e quando ficarem vazias as portas da curiosidade autêntica, mesmo assim sei que o desafio de sentir é uma alucinação endomorfica de que não prescindo mas não significa nada porque não espero ser diferente do vazio penhasco que apesar de previsto, não enfrento (eterno conflito), vivo da mentira e do desconforto, não me convidem para o programa de desintoxicação da impotência virtual porque o que quero é viver pendurado nesta alma ingénua e embalsamada, posso não albergar grandes pensamentos ou aptidões mas modero as explicações para o mistério da alma cotada e reporto-me em estratégias consumadas.
  Sou sério candidato à fraude e ao roubo (como governador de um castelo extra-sensorial) reconheço-me ainda mais corrupto do que me julgava inicialmente quando ainda habitava em paz comigo, agora a capacidade de me debater esfuma-se e navego á bolina, ao sabor do temporal.
  Não posso cultivar mais a indignação pois corro o risco de ser barbaramente derrotado por ela em conflito bélico e directo (homem a homem), espancado até á morte. Administrei mal a minha cota parte de senso comum e resultou no desastre que se conhece, me travisto infinitamente de poeta mas não avisto nada de novo na estrada em que um cantoneiro ainda insiste em volver a terra da berma, cada dia que passo por ela envelheço um pouco e na berma crescem ervas, flores amarelas e um rastilho do odor bucólico, ele me devolve o sentido prático de convívio e com o despropósito de andar por esta estrada despido, tenho saudades da estrada, atalho do insignificado.
  Possuo uma dificuldade inerente aos cegos ocasionais de me deslocar entre as árvores e os obedientes servos e pasmo quando vejo contorcionistas e equilibristas revirarem latas de lixo abocanhando os restos da utopia que a história nega.
 Não uso outra roupa senão a emoção e quando estou nu, espontaneamente a minha mente embriaga-se de liberdade, depois miro-me no espelho mas a roupagem não me serve quando a envergo e não tenho outra para me vestir, desfaz-se o preconceito e a viela minha paralela espelha a angústia, numa aflição auto-infligida como quando pondero no que sentiria se me abandonassem numa lua sem o reflexo na fachada.
 A ligação amorosa com a personagem plenitude estende-se até pr'além do entendimento e da paixão. Tomara que alguma coragem tenha de renunciar a esta sensibilidade instável, quiçá insuportável e egoísta de me auto criticar.
   Opúsculo sinistro é o manifesto de saudade no futuro invicto, faziam-me jeito os sortilégios cabalísticos das sílabas que não entendo para que me afoitasse no luar depois do fim dos tempos.




Joel-Matos (12/2010)
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sábado, 4 de dezembro de 2010

Canção do pão (ou a revolução dos "tesos")



Não sei o que a manhã mostrará,
Não avisto no futuro uma só sobra,
Que seja broa ou pão, nesta Terra convulsa,
Nem na multidão (ainda assim) isenta de firmeza.

Sou descrente de uma confiança
Tão escassa no amanhã, nomearei
Sem dúvida a revolta Franca como arcaica,
Com tolos degolados no terreiro do rei.

(Vive la Repúblique, viva a República)

Não sei se amanhã será revogada
Pelas sombras ou em círculos de história
Infindáveis a giz tendo no esquecimento advogado
Ou se tudo não será apenas uma alínea

Do decreto-lei e do  ditador que aí vier
Não sei o que o amanhã nos trará,
- Dizia eu - mas poderá alguém ver
Pr’álem das paredes de greda e pedra

E das grades de prisão que nos cerca?
Basta de alçar promessas falsas,
Baseadas em astutas falácias,
Não absolveremos quem nos insulta.

Não sei o que o amanhã me trará,
Avisto no futuro uma sombra bem negra,
E não sei se minha também será,
Na canalha de míseros sem pão nem terra

De tocha na mão no Terreno do poder
Mal usado, sem compaixão
Espetaremos uma "naifa" na goela dos ganaciosos
Chefes das nações (viva a revolução dos "tesos")

Não sei o que amanhã me trará,
Mas suponho que outra, i’nda mais explícita canção,
Se esta paixão não incendiar outros espíritos í’fora
que peguem fogo na boreal aurora

Joel Matos
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30/11/2010

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Lilith


Não me surpreenderam ainda os meus dedos curtos,
Num corpo de barro, sem o arrojo que o revele,

Mas abria um buraco no céu, se Lilith viesse por ele
E me assombrasse com os seus dedos compridos

E a língua infiltrada, explorando os recantos,
Como seres danados, sob uma mesma pele,

“-Porque hei de eu deitar-me debaixo de ti”
Dizia simplesmente a fascinante Lilith,

“-Se eu também fui feita tua igual, do pó,
Não da meia-costela do Adão com nó na goela,

Que com ele partilha, da fraqueza e não o poder,”
Eu abria um buraco no céu se Lilith viesse por ele,

E me amarrasse; e eu me amarrasse a ela,
Alimentando -nos de sexo, sem férias,

Na cama menos ingénua do universo.
Caiu uma lua nova do céu, numas tréguas

Perfeitas de nuvens -Lilith veio nela…




Joel Matos (26/11/2010)
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sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Navio Fantasma

(Cape Tribulation, Australia, 11 de Julho de 1881)

(O futuro rei da Inglaterra Jorge V e a sua tripulação de 12 homens no navio,  HMS Inconstant, avistaram o navio-fantasma no dia 11 de Julho de 1881 quando navegavam na Austrália em Cape Tribulation)

O Navio Fantasma,
É coberto de algas, na proa e no mastro e o espectro, no barco
(o capitão Bernard Fokker , rosto de peixe e corpo de homem)
Berra em silêncio, com o oceano e o madeiro podre do casco,
Num nefasto rangido, quase perpétuo, como as vagas
E a errática andança pelo mar, no negrume das sombras,

O fantasma maldito, desafia-o no convés e o nevoeiro ambíguo,
Tudo cinge, num abraço de cal e morte. No porão do tempo,
Os conjurados navegantes parecem arder, num eterno fogo-fátuo
E galgam, galgam ondas, montados nas costas do demo,

Lançando de quand’em vez, um esgar supérfluo, ao luar sem face,
Talvez por inveja, da lua, ao invés deles, possuir claro aspecto,
Ou evocando as noivas, que os esqueceram, no ardor do clímax. 
(Defuntos sem olhos, outrora jovens, caídos em desgraça, no mar insurrecto)

Portos em que amarra o capitão Dutchman não haverá primavera e flores,
Pára o fluxo do tempo, soltam-se todas as dores, nas garras de irreais seres,
Almocreves do demónio, Trafica-se, tormento, abominação e ódio.
Nos areais e praias a carnificina lembra, O inferno de Dante ou episódio

 De John Carpenter em filme, grita-se nas ruas,fujam pelas vossas almas,
 Vem aí o Der fliegende Holländer e o pânico alastra, nas aldeias e vilas,
Tal a famigerada reputação do navio, condenado para sempre a vaguear,
Pois o comandante, Fokker, usou dados viciados, com o diabo ao poker, a jogar

(Procura o capitão nas aldeias da costa e no mar uma mulher que lhe jure
Fidelidade eterna e o livre deste tormento)



JORGE SANTOS (11/2010)
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terça-feira, 16 de novembro de 2010

Quem Sonhou o Amor...Doía-lhe apenas no Desejo





Não canto de noite porque no meu canto do fundo escuro da casa, Nem sei quando é noite ou se é dia, Ou quando acaba esta e começa o outro.
 Não surpreendo o sonho porque durmo de dia, Acordando de quando em vez, Enquanto na noite permaneço acordado, Dormindo apenas enquanto ele se revela em sonho E me vela deitado e ao meu lado. (imagino eu)
Por outro lado, se canto a ilusão, Ela me reduz no tamanho, a uma azeitona preta
E acabo perdido num universo escurecido e frio, Num oceano alheio de estrelas.
Também não canto o dia, No meu canto o raio da luz acaba entrando mas por tempo curto
Porque no meu canto não toco nas barbas dos céus E em nada mais que não seja escuridão.
Não importa o tempo que faz lá fora, Nem se chove, nem a hora do dia,
Eu o reinvento no sonho e no facto d’ele projectar a irrealidade.
E no que sonhou o tempo? Sonhou o que seria eu sem o incontrolável futuro e num ínfimo momento,
Sonhou Tristão e Isolda, o magnífico mago Merlin, Sonhou a Ordem da Rosa e a Rosa de Luxemburgo,
Sonhou a noite e a luz do dia, a música, sonhou a obscuridade dos castelos, O som da chuva na floresta, sonhou a guerra de Tróia, As palavras, sonhou o livre pensamento, o arquétipo da Atlântida,
Os números primos, sonhou o rosto de Deus, a cor branca dos seus cabelos, Sonhou o próprio Deus depois. Depois sonhou-me vazio, Num despropósito abandonado por Ele, mas antes sonhou que haveria de reescrever d’outro modo “paixão”, Haveria de repensar o facto da existência da luz negra no espaço.
(Sou um objecto quase acabado, mas sem ardor, Morrendo na sua bancada de trabalho)
Não importa o que sonhe o tempo, continuarei vencendo insónias E sonhando num amanhecer que não me convence Porque não é igual à madrugada em pérola do meu sonho e ainda não ouvi o toque Que proclama a alvorada e o fim do pesadelo.
No meu quarto o raio de luz, é obstinado E não atravessa a cortina de veludo negro, Se reclamo, na penumbra ele se perturba E me abandona definitivamente no recanto negro da sala.
E quem sonhou o Amor?
Nem sei se o amor será, (como dizem) um filósofo desempregado, Sonhando corações com rendas e flechas, De preferência desabitados e pouco usados. Quem o terá sonhado?
 Tristão e Isola sonharam o amor, A Rosa de Luxemburgo não sei mesmo se amou mas talvez tenha amado
Nas reuniões do partido assim como “La Pasionária” do comité-cental,Ela terá inventado talvez a paixão como um estado de alma revolucionário Ou Florbela Espanca ainda assim inventado a solidão apaixonada do Alentejo E inflamada pelo ardente sol do meio-dia.
E quem a inventou a paixão?
Que o tempo esmorece e o sonho frio de novo reacende Nos lumes das madrugadas em tons de pérola!?
Quem a inventou? Eu não, não canto a Paixão nem o Amor, Porque neste canto a paixão  (p‘ra mim) não conta, É como o raio da luz que entra pela porta, cedo, E logo se vai sem deixar rasto, se esvai como mistério para uma outra dimensão negra do espaço-tempo.

“Não canto a noite porque no meu canto, O sol que canto acabará em noite.”








Doía-me no desejo



Quem inventou o AMOR, doía-lhe apenas no desejo,
 Até agora doía-me apenas o desejo, Como tudo o mais, mas noutra parte do corpo,  por vezes doí-me a alma e o desejo no que digo e  não chega nem a bom porto, nem a porto algum, de modo que me limitarei aqui ao desejo de falar comigo "patati-patata" , continuarei contudo a escrever como um diário intimo, (quem quiser que leia, agora ou em algum dia), ele é público e poderá servir de antídoto para outras dores doutras pessoas,em alguma parte do corpo,  espero que passem estas minhas dores d'alma , pois que são tão intrínsecas, mas tão obstinadas, como as miragens,(só existem na minha febril imaginação).
 Sinto-me sazonalmente nu e cru, como um tronco sem folhas no inverno ou árvore d'folhas caducas e as palavras não cobrem a vergonha que sinto, por não me crescerem na parte cinzenta da casca, grossa e feia.
Desejava viver mas doía-me o desejo, agora dói-me a alma.
Não consigo viver escrevendo por menos, e menos ainda sei viver se não escrever diariamente pelo menos, mas é como respirar numa casa mortuária, penso que sou o único que aqui, ainda respira  e, quando olho para o lado, estou só e numa enorme cripta com imensas arcas de zinco,agora me lembro porque tanto gostava de Franz Kafka, era dele este  imaginário também  e que eu  devorava quando era criança,lembro-me da "Metamorfose" quando o insecto era cem vezes maior que o normal e o perseguia, ou do "Castelo" e a impossibilidade do "Agrimensor" subir até a porta da fortaleza. Eu,por meu lado acabo sem ter força para tentar "beijar"o "meu público",os púlpitos são muito altos para mim (sou de pouca estatura e menor estrutura descritiva) ou então, na plateia não entendem o meu "linguarejar",(nunca entenderão, todavia).
Portanto aqui estou no fundo desta sala cor-de-salmão, com espelhos, imitando  "outros rostos" nos  meus próprios repetidos e nos repetitivos gestos (de tesoura e outros), pensando que faço parte dessas mensagens ditas por "tais outros", umas já estafadas, d'outrora, outras inusitadas quando apenas uno as opostas pontas ou desarrumo as palavras que encontro perdidas ou dependuradas por aí,  encontro nelas, outro sentido, menos nobre para a decoração existente no hall de entrada das casas.
Falava em miragens e encontro-me nos parados desertos horizontais sem ter, nem água, nem fontes, isentos de paisagens e dos verdes preciosos que preciso,todos os meus mais terríveis fantasmas ociosos de areia, me rodeiam, lembrando as danças com bruxas disformes e negras de Goya,nem sei porque me odeiam tanto elas, nem sei se é miragem esta sala, funda, perfumada e cor-de-salmão, funda, funda... e sem saída, que me abocanhou e engoliu inteiriço da manhã e até ao almoço.
(por isso vivo, abrigado, deste lado da terra e de uma face da vida de oculto insecto caseiro e de tempo indeterminado)
Dói-me no desejo...por obrigação de quem sonhou o amor.

Joel-matos (11/2010)
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terça-feira, 2 de novembro de 2010

De mim não falo mais


De mim não falo mais,
Só arranquei um desejo da poça,
Se bem que nem o conheça,
Mas não falarei dos demais,

Que o diabo os carregue, (aos outros leais seis ou sete),
Disseram-me estes: “Anda, anda ver o lindo pôr-do-sol no cais”,
Mas até o sol me segue a escorrer de sangue,
Se ainda tento fugas desleais.

De mim não falo mais,
Mas Terei horror do luar disfarçado de lobo,
Na copa dos velhos, velhos olivais,
Quando o meu ensejo for negado

E esta despida carne comida por animais,
(Agora no claro da noite ainda rezo em segredo)
E se o desejo meu tremer de medo.
Ainda mais odeio a convicção da cereja na ramada,

Quando esta fica encarnada e enchida
E com cachaço de tocador de trompeta
E a ventania por nada fica parada,
Nem aquela aragem de quem se sente longe e volta.

Por mim não falo mais,
que falem os espíritos ,das crenças da noite,
(Tidas como horríveis)
E nem espero que o desejo de que falo, se nem me conhece, volte.


Joel Matos (2-11-2010)
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Pra lá do crepúsculo

Pra lá do crepúsculo Deixei de ser aquele que esperava, Pra ser outro’quele que s’perando Em espera se converteu, alternando Despojo com eng...