sábado, 2 de janeiro de 2021

A simbologia dos cimos





O principio e todos os lugares, a gnose dos dedos
São os meus dez medos cerrados como rochedos
Abertos os da mão grossa com a outra, a leve, ingrato
O gesto colado à boca, assumo o que digo, gesticulo

Outra conversa, pois é comigo que me estou sentando,
Ou estava, correcção dos meus falsos ecos, dizendo
Do que fui antes, era quotidiano, sem espaço quanto
Tudo o que faço, a diferença entre mim e eles, dedos

Falantes sim, pois só os leves e o livre voa sem peso,
Sou ambos, neste caso o voo plano dos sem jeito, leões
Com os pés dobrados num cepo tosco de faz de conta,
Pau de madeira, pobre e seco, actor, cão pisteiro,

Figuras que eu próprio crio sem êxito, irreais quanto
Eu mesmo e na mesma proporção dos cimos través
Dos quais me acrescento por aproximação ou defeito,
Pasmo perante a estranheza com que desejo o manto,

O abstrato, ainda que com consentimento, mais que por
Volúpia em excesso, digo de mim para mim até me
Convencer do oposto, que é não estar em meu poder
Alterar o ruim e o grosso, o fraco em falangista canalha.

Clandestino, é como me afiguro perante o universo,
E nem a fantasia me desliga, do vulgar substantivo
E da arte decorativa, evocada por cegos da cabeça
Aos pés, sincero malabarista, dez dedos mal situados

De cada lado do corpo, equidistantes uns dos outros,
Equilibrando todos os locais, o mundo que conheço,
Corrosivo, gástrico, florescente em ácido abdicante,
Mas meu princípio e fim, assim a Terra e esta gente.

Princípio meio e fim …



Joel Matos ( 31 Dezembro 2020)

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Por um ténue, pálido fio de tule

 



Por um ténue, pálido fio de tule



Em cada dia que me aconteço, suspenso,
Nimbo d’mim mesmo, me convenço que os
Símbolos têm alma própria, a vida é breve
E os fios, enigmático tecido e pele
Como sejam de um genuíno ser vivo, aviso

Num ritual iniciático, conduz-me devagar
Igual a linguagem de espíritas, em lume ocre
O que fica cerzido, o oráculo dos mortos,
A razão das coisas vivas, siglas em seda,
Da existência, do fim ao começo, profecia,

Entendimento, uma presença no limbo,
O juízo do cosmos, as cordas e o espaço/
Tempo, o privilégio da alma, cifras são caules,
Rituais de visionário quando Omega antecipa
O Alfa, a linguagem do Indo, de quem

Não possui corpo, aspecto, uma Sibila
Sem focagem, imprecisa e ténue, singela
E dispersa no ar, toca-me e sinto-a tocar-me,
Entra por mim adentro, sedenta, desconhecida
E sem pedir licença, por direito natural breve

De “quem-me-dorme” e me acorda, ao-de-leve
Por um ténue, pálido fio de tule, convida-me
Em sigilo e silêncio, depois nada…mais nada
E nada mais foi ou será visto, pronunciado
Por esta boca, este lábios, estas pálpebras.




Joel Matos (15 Dezembro 2020)

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Epistemologia dos Sismos





      Epistemologia dos Sismos

ou  A simbologia dos símbolos



Eu queria ter tido dos outros, a forma,
Numa frase escrita, num fragmento
Curto, numa memória circular, um registo
Que não o meu discurso descrente,

Em que me descrevo, não como
Um semideus nu e cru, mas parecido
Aos quais queria ter sido, os outros, mais
Fácil imaginar-me perpendicular, um fuso

Por uma questão de entendimento do prumo,
Do que seguir a linha obliqua de um ovo,
Direi eu divino, não por uma questão
De humildade mas por escrúpulo, zelo

Por mim próprio tão pouco, ao ponto de me
Curvar como vime perante a inverdade
Alheia, é como me descrevo diante
Da alcateia, sendo eu próprio o super-lobo,

O dragão do éden, o ovo parabólico, o sino
Das sociedades secretas, resolvo partir
À descoberta quando o manifesto sou eu, etrusco
Semicego, somo e sigo, evoluo pelos medos,

De modo que não me rache em mais a alma,
Partida entre mim e os demais, que nada fazem,
Como memoria a definir, pó de s’trada, estorvo,
Evoco-me ao morrer com a humilde felicidade

De nada ser, quando sou tanto e tudo mais
Que o divino ciúme pode sentir duma só criatura,
Num ser gigante com dimensão de um ovo,
E ainda digo que “queria ter sid’os outros”,

Menores que eu sou, realmente falando
Do ovo na sua curvatura perfeita e do
Prazer intimo que tenho hoje, quando me
Descrevo e declaro general “do-que-sinto”

“Ao-de-cima”, no cimo do píncaro, nas torres
Dos címbalos, da simbologia e dos símbolos …





Joel Matos (13 Dezembro 2020)

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Não passo de um sonho vago, alheio




Não passo de um vago, vulgar desejo
Com a ideia de ser “de-verdade”
O ar que respiro, o luar e a luz sincera
Do dia, tudo o que sonho, tudo

O quanto eu seria se acordasse do
Aquando dormia um normal, leal sono
E a expressão doce de levar comigo
O que me trouxe me seguindo, desejo

Toda uma realidade dobrada em dois
Que me mereça e não, não porque
Estou pedindo que esta me aconteça
De verdade e dum todo, perco-me

Num bocejo que me impede de agir,
Absolutamente sem vontade e dormir
Será morrer de qualquer maneira,
Porquê acordar sem vontade, objetivo

Ou facto que me trouxe, me seguindo
Agora pó, sombra que me transporta,
Fala do vento na copa do pinheiro,
Não passa de um vulgar bocejo,

Pela mão de quem me arrasta, já sou
O que nunca fui, serei semelhante
Ao céu e à terra, igual ao dia, ao sonho
Sem deixar de sê-lo, vulgar e belo,

À luz do dia, nada disso faz sentido,
Consciência será o não sentir, pensar,
Toda a ideia será verdade e o respirar
Inimigo, o ausente da vontade, o supor

Estar sem estar “de verdade” vivo,
Quando não passo de um vago, vulgar
Anseio que comigo tenho, sendo eu
Quem me transporta a algum lugar dúbio,

Em que tudo, nada tem de meu, a floresta
Que tomei por caminho, o que de mim
Sai e na alma se faz, o silencio a paz,
A luz calma e o meu destino que dança,

Passa estranho, alheio, estrangeiro…




Joel Matos ( 08 Dezembro 2020)

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Cumpro com rigor a derrota




Será minha a minha vida ou roubada
A outros, às sombras, o destino que
Me é dado acreditar e me cabe por
Direito, cumpro com rigor a derrota,

Sigo o resto que a maré deixa de lodo e
Sargaço na areia assim os meus sapatos
E o musgo em carpete sob meus passos,
Que o não os sinto nem ligam meus pés

Ao sub-mundo que me consente apenas
Passadas pequenas em minúsculas, rústicas
Pernas, inútil vida de sombras eternas
Roubados os mortos, perpétuos e terrenos,

Será minha a minha vida ou é simples cinza
Doutras vidas e de quem já viveu e a
Água do meu lavatório, sangue e urina
Que Orpheu verteu no covil do Demor-

-Gorgon. Diz-se que depois de extinta
A cinza não gera fogo e a Acácia não
Floresce de novo em tom amarelo sem
Repousarem um inverno e as folhas, troncos

Nus e despidos, áridos como a minha paixão,
Ardido meu peito e a crença que não sou eu,
Nem me conheço, sendo minha a vida
Esta não me foi dada, sou um arremedo

De outras, idas numa sucessão de sombras
Tão sombrias quanto o escultor cego e surdo,
Que as talhou num panteão que não é meu,
Num poço profundo, longe dos crentes,

De todos e de tudo, não longe do “cu-do-céu”,
Cumpro com rigor a derrota espiritual, digo adeus,
Como cada homem que a vida deixa no caudal
Dum rio sem barca, num mar sem margem …




Joel Matos ( 05 Dezembro 2020)

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Perdida a humanidade em mim





Perdi a humanidade,

Perdi-me da humanidade, não me posso achar mais nela,
A crescente nitidez em mim é igual a um um azul sem cal,
Olhos de perdiz em que os sonhos não se perdem, 
Acrescentam o que vi em vida, vejo que me perdi desta gente,

Me perdi da humanidade e de tudo quanto fui e sou, agora nada 
Me pertence, nada me vence, nada me acaba senão o despertar 
De vez para cento e uma mil formas de ser que não havia
Em mim, isso me inclui sem dúvida num céu que perdeu o tom,

Deixai-me ouvir intenso o que não posso ver, o que nunca sonhei, 
O meu próprio ser outro, não ter pensar como raiz d’pedra greda, 
Desejos inúteis são pesos, vulgares apêndices, fálicos pesos
Ou fábrica de fúteis contas de efeito hipnótico em embalagens

De realidade em formol que não têm espécie alguma de sentir, 
Nem nenhum elemento espiritual essencial, desses sem peso, 
Nem preço, nasci para criar o que outros talvez não entenderão,
Estados de alma, projecções de ideais abstratos, ilúcidos,

Embora nítidos, todo o esforço foi em prol de separar-me 
Do que sei e do que se ergue diante do meu passo de vista 
Curva, visões e desarrumo, enquanto eu legitimo o céu 
Solto, depois de retirados os castros e eunucos castelos

De praça quadradas e antigas, grandezas provisórias, 
Sem alma, semelhante ao som de veículos de ferro 
Chapa e solda, esquadrões da morte de um exército inteiro, 
Desertado, coberto de alcatrão viscoso e palha solta, pregos, 

Perdi a humanidade, o andar é um esforço em falso 
E pode ser que nada valha, sei que  ainda não é o fim 
Nem o princípio do desencanto, o mundo, é apenas tardio,
Os lusíadas um conto, Inefável é o que não pode ser dito

De verdade, Nem na sucessão dos deuses haverá Híades, 
Princesas como promessas por cumprir, tratados “mundis”, 
E esta humanidade sem comprimento nem encanto,
perdi-me da humanidade e de tudo quanto fui, agora nada sou,

Nada me pertence, nada me vence, nada me acaba,
Perdi a finalidade “ao-que-vim”, Perdida a humanidade
Em mim …




Joel Matos ( 04 Dezembro 2020)

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quarta-feira, 25 de novembro de 2020

Vencido

 



Vencido


Quero saber se realmente s’tou vivo
Ou deixei de existir sen’sequer notar
Ter vivido, insignificante levito
Morto, imito como o abster da luz dos astros

Menores que rodeiam Saturno e Uranus
De cores desmaiadas, limadas luas de gelo, frias
Mesmo à luz parada do meio dum dia d’outono
E para sempre, sempre por mais um ano,

Vivo o desejo de infinito que suponho comum
De viventes reais e no qual nem acredito nem
Se hei de estar realmente vivo pra sempre
Na semana-que-vem, nem que seja pra

Morrer apenas por vontade própria em acta
Mas “de vez” e como deve ser na morte
Um certo curto, lúcido e estranho convicto, preso
Em mim próprio pro resto desta vida

Vivida em oito passadas de trinta cinco passos,
Porque não sessenta,  sendo doze  os meses
E as frágeis fantasias presas a mim, como
Marcadas impressões a dois tendo nós ambos

O mesmo comprimento em altura como
Na largura a silhueta dos ombros que
Nos projecta deuses, neste sótão bera e chão,
Tão contraditório eu sou, não diria diferente

Porque não o sou de toda a gente, embora
Vida pareça vida sendo minha de início
Compartilho o desatino de outro, um morto
Sonhando-se vivo, insolvente de sensações,

Vencido.





Joel Matos ( 25 Novembro 2020)
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Pra lá do crepúsculo

Pra lá do crepúsculo Deixei de ser aquele que esperava, Pra ser outro’quele que s’perando Em espera se converteu, alternando Despojo com eng...