sábado, 2 de janeiro de 2021

Epistemologia dos Sismos





      Epistemologia dos Sismos

ou  A simbologia dos símbolos



Eu queria ter tido dos outros, a forma,
Numa frase escrita, num fragmento
Curto, numa memória circular, um registo
Que não o meu discurso descrente,

Em que me descrevo, não como
Um semideus nu e cru, mas parecido
Aos quais queria ter sido, os outros, mais
Fácil imaginar-me perpendicular, um fuso

Por uma questão de entendimento do prumo,
Do que seguir a linha obliqua de um ovo,
Direi eu divino, não por uma questão
De humildade mas por escrúpulo, zelo

Por mim próprio tão pouco, ao ponto de me
Curvar como vime perante a inverdade
Alheia, é como me descrevo diante
Da alcateia, sendo eu próprio o super-lobo,

O dragão do éden, o ovo parabólico, o sino
Das sociedades secretas, resolvo partir
À descoberta quando o manifesto sou eu, etrusco
Semicego, somo e sigo, evoluo pelos medos,

De modo que não me rache em mais a alma,
Partida entre mim e os demais, que nada fazem,
Como memoria a definir, pó de s’trada, estorvo,
Evoco-me ao morrer com a humilde felicidade

De nada ser, quando sou tanto e tudo mais
Que o divino ciúme pode sentir duma só criatura,
Num ser gigante com dimensão de um ovo,
E ainda digo que “queria ter sid’os outros”,

Menores que eu sou, realmente falando
Do ovo na sua curvatura perfeita e do
Prazer intimo que tenho hoje, quando me
Descrevo e declaro general “do-que-sinto”

“Ao-de-cima”, no cimo do píncaro, nas torres
Dos címbalos, da simbologia e dos símbolos …





Joel Matos (13 Dezembro 2020)

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Não passo de um sonho vago, alheio




Não passo de um vago, vulgar desejo
Com a ideia de ser “de-verdade”
O ar que respiro, o luar e a luz sincera
Do dia, tudo o que sonho, tudo

O quanto eu seria se acordasse do
Aquando dormia um normal, leal sono
E a expressão doce de levar comigo
O que me trouxe me seguindo, desejo

Toda uma realidade dobrada em dois
Que me mereça e não, não porque
Estou pedindo que esta me aconteça
De verdade e dum todo, perco-me

Num bocejo que me impede de agir,
Absolutamente sem vontade e dormir
Será morrer de qualquer maneira,
Porquê acordar sem vontade, objetivo

Ou facto que me trouxe, me seguindo
Agora pó, sombra que me transporta,
Fala do vento na copa do pinheiro,
Não passa de um vulgar bocejo,

Pela mão de quem me arrasta, já sou
O que nunca fui, serei semelhante
Ao céu e à terra, igual ao dia, ao sonho
Sem deixar de sê-lo, vulgar e belo,

À luz do dia, nada disso faz sentido,
Consciência será o não sentir, pensar,
Toda a ideia será verdade e o respirar
Inimigo, o ausente da vontade, o supor

Estar sem estar “de verdade” vivo,
Quando não passo de um vago, vulgar
Anseio que comigo tenho, sendo eu
Quem me transporta a algum lugar dúbio,

Em que tudo, nada tem de meu, a floresta
Que tomei por caminho, o que de mim
Sai e na alma se faz, o silencio a paz,
A luz calma e o meu destino que dança,

Passa estranho, alheio, estrangeiro…




Joel Matos ( 08 Dezembro 2020)

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Cumpro com rigor a derrota




Será minha a minha vida ou roubada
A outros, às sombras, o destino que
Me é dado acreditar e me cabe por
Direito, cumpro com rigor a derrota,

Sigo o resto que a maré deixa de lodo e
Sargaço na areia assim os meus sapatos
E o musgo em carpete sob meus passos,
Que o não os sinto nem ligam meus pés

Ao sub-mundo que me consente apenas
Passadas pequenas em minúsculas, rústicas
Pernas, inútil vida de sombras eternas
Roubados os mortos, perpétuos e terrenos,

Será minha a minha vida ou é simples cinza
Doutras vidas e de quem já viveu e a
Água do meu lavatório, sangue e urina
Que Orpheu verteu no covil do Demor-

-Gorgon. Diz-se que depois de extinta
A cinza não gera fogo e a Acácia não
Floresce de novo em tom amarelo sem
Repousarem um inverno e as folhas, troncos

Nus e despidos, áridos como a minha paixão,
Ardido meu peito e a crença que não sou eu,
Nem me conheço, sendo minha a vida
Esta não me foi dada, sou um arremedo

De outras, idas numa sucessão de sombras
Tão sombrias quanto o escultor cego e surdo,
Que as talhou num panteão que não é meu,
Num poço profundo, longe dos crentes,

De todos e de tudo, não longe do “cu-do-céu”,
Cumpro com rigor a derrota espiritual, digo adeus,
Como cada homem que a vida deixa no caudal
Dum rio sem barca, num mar sem margem …




Joel Matos ( 05 Dezembro 2020)

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Perdida a humanidade em mim





Perdi a humanidade,

Perdi-me da humanidade, não me posso achar mais nela,
A crescente nitidez em mim é igual a um um azul sem cal,
Olhos de perdiz em que os sonhos não se perdem, 
Acrescentam o que vi em vida, vejo que me perdi desta gente,

Me perdi da humanidade e de tudo quanto fui e sou, agora nada 
Me pertence, nada me vence, nada me acaba senão o despertar 
De vez para cento e uma mil formas de ser que não havia
Em mim, isso me inclui sem dúvida num céu que perdeu o tom,

Deixai-me ouvir intenso o que não posso ver, o que nunca sonhei, 
O meu próprio ser outro, não ter pensar como raiz d’pedra greda, 
Desejos inúteis são pesos, vulgares apêndices, fálicos pesos
Ou fábrica de fúteis contas de efeito hipnótico em embalagens

De realidade em formol que não têm espécie alguma de sentir, 
Nem nenhum elemento espiritual essencial, desses sem peso, 
Nem preço, nasci para criar o que outros talvez não entenderão,
Estados de alma, projecções de ideais abstratos, ilúcidos,

Embora nítidos, todo o esforço foi em prol de separar-me 
Do que sei e do que se ergue diante do meu passo de vista 
Curva, visões e desarrumo, enquanto eu legitimo o céu 
Solto, depois de retirados os castros e eunucos castelos

De praça quadradas e antigas, grandezas provisórias, 
Sem alma, semelhante ao som de veículos de ferro 
Chapa e solda, esquadrões da morte de um exército inteiro, 
Desertado, coberto de alcatrão viscoso e palha solta, pregos, 

Perdi a humanidade, o andar é um esforço em falso 
E pode ser que nada valha, sei que  ainda não é o fim 
Nem o princípio do desencanto, o mundo, é apenas tardio,
Os lusíadas um conto, Inefável é o que não pode ser dito

De verdade, Nem na sucessão dos deuses haverá Híades, 
Princesas como promessas por cumprir, tratados “mundis”, 
E esta humanidade sem comprimento nem encanto,
perdi-me da humanidade e de tudo quanto fui, agora nada sou,

Nada me pertence, nada me vence, nada me acaba,
Perdi a finalidade “ao-que-vim”, Perdida a humanidade
Em mim …




Joel Matos ( 04 Dezembro 2020)

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quarta-feira, 25 de novembro de 2020

Vencido

 



Vencido


Quero saber se realmente s’tou vivo
Ou deixei de existir sen’sequer notar
Ter vivido, insignificante levito
Morto, imito como o abster da luz dos astros

Menores que rodeiam Saturno e Uranus
De cores desmaiadas, limadas luas de gelo, frias
Mesmo à luz parada do meio dum dia d’outono
E para sempre, sempre por mais um ano,

Vivo o desejo de infinito que suponho comum
De viventes reais e no qual nem acredito nem
Se hei de estar realmente vivo pra sempre
Na semana-que-vem, nem que seja pra

Morrer apenas por vontade própria em acta
Mas “de vez” e como deve ser na morte
Um certo curto, lúcido e estranho convicto, preso
Em mim próprio pro resto desta vida

Vivida em oito passadas de trinta cinco passos,
Porque não sessenta,  sendo doze  os meses
E as frágeis fantasias presas a mim, como
Marcadas impressões a dois tendo nós ambos

O mesmo comprimento em altura como
Na largura a silhueta dos ombros que
Nos projecta deuses, neste sótão bera e chão,
Tão contraditório eu sou, não diria diferente

Porque não o sou de toda a gente, embora
Vida pareça vida sendo minha de início
Compartilho o desatino de outro, um morto
Sonhando-se vivo, insolvente de sensações,

Vencido.





Joel Matos ( 25 Novembro 2020)
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segunda-feira, 28 de setembro de 2020

Esquecer é ser esquecido

 






Esquecer é ser esquecido e saudade a substância do vidro,

Um adormecer em forma de dom, em que consciência
E apego são bastardos naturais de uma mesma escara,
Nascidos no ventre uma de outra como tumores, abscessos
Malignos, ambos com igual instinto, cada um nega
Parentesco e origem, coisa triste o’dormecer da vontade,

Confesso a indiferença, sobrevivo nulo perante crenças
Fuinhas, confundo a porta dos fundos com a plateia,
Sendo eu próprio escalador de vácuos e espectador
Assumido de mim mesmo, que o digam os acenos
Sem conteúdos, as palmas de despedidas, mas eu atuo
Como um deus seminu de brilho, não suporto fingidas cenas,

Sou opinativo do tutano à nuca por não ter certezas
Concluídas nem nunca um modo de ver tão simples
Quanto o espectro da candura, sou por direito absoluto
Monarca como fardo, e um tísico embora o meu espirito
Seja dono do mundo por não haver outro, tirando este
O qual amo mais que tudo, esquecer é ser esquecido,

Nasci liberto de domínio e é assim que serei, desprezo
Tiranos altivos como proas de navios decretando quem
Morre e quem fica perene, embora cacos de lembranças.
Tudo é poesia, até o que se esquece, acontece-me às vezes
Esquecer aquilo que não quero e concluo ser alergia
Ao que suponho querer e não me faz falta nem quero,

Esqueço em homenagem a mim próprio e ao absurdo
Ensejo que é ser suposto facto e não ciente realidade,
Qual ritual duvido de coração e alma. Agora é pra sempre,
Fui descuidado na seleção do que se esquece, esqueci
Ainda ontem a utilidade como se fosse uma derrota
E a saudade do que hei-de ser eu não, a ilusão do sonho

Ou o trinfo da morte concreta, o crepúsculo não se
Mede, nem é uma ciência, do meu coração às vezes
Duvido, mente-me acerca de um régio destino e eu
Indigno do que creio ter, um raro instinto de poente,
Saudade é gente que o esforço não apagou e a maioria
Vive em mim, ser esquecido é esquecer, escolha-visco.

Admito tecer por dentro uma teia com fios de vidas
Que mais parecem sonhos de vidas que não tenho
Mas conheço ainda que doa não ser eu um outro ser
Menos fragmentado entre consciência do desapego,
O chocolate e a cereja, o paladar da estranheza,
O prazer de ser esquecido como manifesto à indiferença,

Encaro-me com o desapego que tão dolorosamente
Represento a sós comigo, chamo-lhe de “necessidade
De me sentir vivo” essencial à falha de que me rodeio,
Sem que me aperceba não sou eu, mas um outro eu,
Semelhante a mim mesmo e enfim esquecido,sobejo  …



 

 

Joel Matos (Junho 2020)
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terça-feira, 2 de junho de 2020

A sucessão dos dias e a sede de voyeur



 



 





(Nada menos estranho para mim do que ser universal, humano e eu próprio, de versão consciente e de consciência livre, eu e sempre que posso)




A sucessão dos dias e a sede de voyeur
A sucessão dos dias é de facto consensual, a inalterável sequência das horas, a sequela da sensação dos minutos, a prossecução das gerações e das estações do ano, são como um guia, uma cúmplice realidade, viva e implícita, embebida num sudário ou num sáurio sonho, qual fazemos todos parte, a nossa expressão superlativa-quantitativa, embora diminuta, do tempo em forma de arte, pois que emoção é isso, a impressão expressiva do erro racional e não admitido, em forma de apelativo prazer, de estimulante vivido e vital perante a crueldade sincera e a consciência dolorosa in-vitro, que é viver de facto e realmente uma vida ultra e curta, sem sensações para invocar, nem dimensões de ordem extra, a pira ou o crematório para os oito intuitivos sentidos que nos restam e hão de soçobrar pateticamente na gesta de fogo versus ar e luar.
Se todos se sentissem tão comuns perante a vida e nós, como eu, perante a frieza da solidão que de facto se sente e eu sinto mais e muito, na paisagem agreste que me reveste da mesma forma e no mesmo género de satisfação de que eu sou, decomposto a meio, e todos tivessem a mesma sensação indiferente perante o vício solto de pensar e sonhar, dulcíssimos como a natureza do ar, lar intimo do que sinto e o orgulho ferido da realidade que a transfigura em irremediavelmente minha e eu em fatalmente seu, sucederíamos à quinta dimensão do tempo / espaço que diziam as divindades gregas suceder aos desejos de Omega, nas paisagens estéreo/ impassíveis, da fala e do falar que apenas na lua e no luar podem e há-de-haver em cada um, como em todos nós.
Controlamos os nossos defeitos em batalhas e rebeliões viscerais e não há, não existem impropérios reais, nem impérios virais “Do-bem” ou do mal que nos valham, nem sacrifícios que não amputem a razão na dimensão pura do ego, na vala comum e o eco da contenda que nos avise que perdemos. Clamamos pedindo repouso, misturando à lama do chão, ossos e as escaras dos que se diziam superiores, por quem os descreveu, sem estarem presentes nos sons dos campos de guerra, vazios passageiros do que resta da chama real, onírica e do vale de fumo, sem fundo que se chamam, ou de “falhar” ou de fama humana.
Na loucura, as faunas planas vestem-se de ouro em escamas e nas tardes sem honra, estranhos frades de toga buscam um Santo Graal sem validade, sem hora, nem nenhuma outra cura para a fé humana que não seja fraude e a incapacidade de viver sem o Omega, nem da palidez do Alfa, no mármore rósea nas capelas bizantinas, outrora na Capadócia extrema.
A isenção de sensibilidade censuradora, pisciforme, não nos purifica, antes nos esteriliza as escamas ao ponto de negarmos gerações conceptuais divergentes, somos seduzidos pelo asco e pela “touguia” universal, triunfal, pela mecânico quântica da mesquinhez vigente e da gargalhada persistente e viscosa, aplaudível por multidões universais, tosquiadas, sem formas e iguais a nós, eles mesmos, isentos e parciais, asquerosos pisciformes sem cor, ninguém de alma ilesa, acomodados funcionários e convalescentes do sentido estético, conspurcados assintomáticos.
A sucessão genética e embrionária é facto consensual e claro, uma tragédia estéril, quando se caracteriza de ambição e ganância gonorreica e a avidez protagoniza um placebo pouco nobre na ilusão de reproduzir semântica duma caixa de cartão liso ou papel canelado, mas vendável, já previamente cozinhado, com data de consumo obrigatória e a promessa de fomentar a realidade metafísica das sensações que não possuímos, mas reclamamos, tal como estéreis animais de esterco e de pasto para açougueiro.
Reajo contra a ideia cerebral, exacerbada de verdade, acertada e venal que vulgarmente se agrega ao papel higiénico numa crise diarreica fortíssima, provoca em mim uma náusea verbal mística e um sufoco do pensamento que vai além do desígnio consciente repugnante e auto purgante, persigo com o instinto do que procuro, como se fosse uma clarividência arejada, arrojada e doce, embora lhe dê uma designação de destaque, sinto-o agudo e pungente, assim como algo externo a mim, como um destino, um conceito, uma manifestação do que – “há de vir a ser”, clarividente e desapossada até ao tutano.
Bem hajam no futuro os deuses brandos e os mancos que pronunciam simples profecias, pois não haverá tíbias, nem pictóricos porteiros nem cadáveres pendurados pelos dedos em ameias, nem tratados tardios de paz, nem Sibilas, apenas a sucessão parda dos dias parados, como se fosse uma praia vizinha de Tróia, depois da guerra, num mar inclemente mas que é de todos nós, qual nos escapa como areia pelos nós dos dedos, como se fossem cabelos de Portia Deusa, pacata e mansa …a sucessão dos dias e por fim luz, luz ao fim do túnel …
No final da luz o fumo e o fim do túnel, sei que já disse tudo isto pois “ando-pouco-de-palavras” ultimamente, uso do mais grave que já disse, por não saber dizer nem mais, nem melhor, sou tudo o que me acusam e ainda mais, mas felizmente para mim segundo eu, ou não, segundo outros. Elegi neste lado do mundo, nesta parcela gástrica virtual,  uma vaidade mecânica de escrita pouco limpa e gasta como opção primeira e privilegiada de pensar e de pensamento e, na minha escrita não permito, nem permitirei, nem a febre dos fenos, nem do contágio decadente que polui de través, é e será o que constituí na minha interpretação de espaço, livre, comum de critica criativa e construtiva, excentricidades são e serão bem vindas desde que não rocem a imbecilidade expressiva e a rudeza, as expressões poética querem-se, quero-as eu e todos nós, vazias de exterioridades egoísticas, assim como a caixa onde o gato defeca diariamente se quer limpa de novos excrementos para que a verdade da agua pura flua e escorra por entre as vistosas pedras em cascata numa montanha livre de doenças parasitárias, malignas e esterilizáveis de pensamento e ideias, que o som das cristalinas águas nos acompanhe a todos e não o cárcere da infâmia e a lâmina da ignomínia com que muitas vezes sou reclamado a cooperar e reitero desde já um voto pelo bom funcionamento das nações e das instituições que minhas são também, quais posso e devo chamar assim, para que não se abra a tampa e pandora invada as nossas oníricas quimeras e as transforme em terríveis sensações decrepitas bem acima da linha do cabelo, bem hajam poetas e homens verdadeiramente amantes da escrita e da poesia, “no pasaran”, jamais passarão, eu passarinho.
Por fim luz ao fundo do túnel, não quero incendiar nem demais, nem – “de-menos” – os ânimos, apenas desejo e apelo ao bom entendimento  funcional do género humano e de algo que pode e deve ser belo, a partilha de palavras e o desejo, egoísta mas louvável de ser ouvido livremente e partilhado em comum por tantos e muitos ouvintes. Obrigado a todos por lerem o que partilho e o que escrevo, nestes momentos difíceis que atravessamos, toda a partilha é, como diz Bernardo Soares “A mais vil de todas as necessidades — a da confidência, a da confissão. E a necessidade da alma de ser exterior ” Obrigado a todos, bem hajam os seres humanos livres por vontade, bem hajam todos os poetas que amam as letras que usam, de todas as formas e em forma de arma, inclusive recriando uma nova, alterada e revolucionária sucessão de dias horas e mentes, pois que inalterável não é apenas a dor, Inalterável é a cachaça e um antropólogo em Marte, inalterável a minha sede de voyeur e a metafísica do terror, inalterável até o leite da Deusa Hera, mas eu não altero em nada seja o que for que sinta, seja ele quem for inclino-me ante quem é alterável quanto a minha dor que alterna entre a brava fúria e essa a qual me converto por amor.
Quando uma pessoa quer ver repetidos os mesmos padrões nos gestos, nas estrela mestras e os mesmos sorrisos nos rostos dos outros e não apenas nos das crianças, imutáveis quanto os castigos quer nos céus como nas gentes e nos despojos de dia zero, que as inúmeras vidas nos deram, quando alguém quer tudo isso o herdado e o por herdar, duma só vez, na breve vida, torna-se autista, Inalterável, incolor, inverneiro…


Joel Matos (Junho 2020)

quarta-feira, 15 de abril de 2020

A um Deus pouco divino …



Quero que nunca mais desponte o dia
Em lugar nenhum do mundo, pra que eu
Durma desperto, dividido entre o que conheço
E o que lembro e o sonho intimo, profundo,
Divino de ser tudo quanto a minha vista vê e
Reconhece como sendo o que existe, tudo quanto
Há e em mim mora, pois de Deus não sei nada,
Quero que nunca mais desponte o dia,
Enquanto eu viro outro mundo em roda na procura
Da cura pra este de que se esqueceu um Deus
Pouco divino, entre Ele e eu não há concílio
Moral ou o que afirmam ter sido, a julgar
Pla ausência de fé, nem é lei nem dá prisão,
Tudo “coisas” só, o resto são crenças entre Tu,
Nós e o mundo lá fora, já nem sei se quero partir
Ou chegar, pensar e sentir são opiniões diversas,
Nada mais que rostos de trinta mil máscaras,
Sinal que é fácil trocar palavas por ensejos,
-Gestos são oposição de polegares, expressões
Ventrículas tal como o bocejar barroco
De um retábulo não longe nem perto, em
Moscavide, é como me sinto, ignorado em
Ponto cruz, deserdado de magia na iris,
Num mundo onde salva tem gosto a malva,
Mas ainda com raiva d’fogo uso a palavra,
Uso a palavra magia quando olho
Nos olhos Teus, sendo eles azuis d’mar
Invento o uso, quando não sei de cor as cores
Do arco-íris, do vento acariciando a cevada,
O sentido e a boca me envelheceram, sim,
-De tantas palavras gastas, nem todas
Com gosto a salva e a sim, e a nada …
A um Deus pouco divino …
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Joel Matos (Março 2020)

Ninguém me distingue de quem sou eu ...



Ninguém me distingue de quem sou
Eu, tão cheio de lunares cansaços, mortos
Mundos podem causar-me nos olhos cegueira,
Tanto como mudas causas, tal como pregões falsos,
Meus olhos tão normais quanto outros
Que dentro deles vêm, um universo único,
Igual aos demais que vemos na rua
E não reparamos, tão iguais somos
Todos, pousamos os olhos nos que vemos,
E não tememos, apaixono-me p’los que vejo,
Penso neles, pousos de veludo, mundos paralelos
Tão nítidos quanto dos olhos, as planícies,
Os canais em Marte daqui perto, em Saturno,
Não me contento com a visão de outros mundos,
Páginas em branco, memória não registada,
Nem nascida nem gerada, assim eu sou,
Como o Sol que não nasceu pra ser Lua,
Eu não nasci pra ser amado, sou o
Mistério, a singularidade nua e crua,
Aguardo plo armistício, armado
De unhas, “puas”, pedras e machados,
Sou a encarnação da sombra, presságio
De vidente, antes de ser gerado o tempo
Consagrado aos comuns sentidos dos
Outros, a terceira tarefa do Omnipotente
Foi a minha vontade prússica, semelhante
Ao Cianeto de ópio, sem fé no próximo,
Nem no próprio, anacoreta da desgraça
lactente. Eu não nasci, fui gerado a cru,
Ninguém me distingue, salvo outro invisual auditivo
Perante a sua figura em papel desdenho.
Eu desdenho-me, e estes dedos e estes ossos,
Obedientes ao esforço bruto,
Mais soberanos que eu próprio, o infame
De corpo mal tatuado, imundo,
Incapaz de sentir paz ou emoção,
E eu me desdenho ao ponto esquivar viver
E isso exprime o que sou, um ponto,
Uma ínfima fracção do todo, uma inflamação,
Um conto mudo, um desenho,
Uma forma de ornamento ao corpo,
Consubstanciado a branco e preto,
Vulgar em tudo até no fôlego,
O meu ultimo refúgio,
É viver na inveja de
Não ser eu, um indistinto outro,
Distinto de quem, suposto eu sou,
Severamente eu e só,
Ninguém me distingue de quem sou.
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Joel Matos (Março 2020)

Objectos próximos,




 



Durmo com um punhal na nuca
E outro onde sinto menos, objectos
Próximos sempre me meteram medo,
Imagino o sol progredindo plos cabelos
E por entre os cinco dedos duma mão,
O som do cotovelo quando movo o braço,
Lembra-me sem querer, o mar e o rochedo,
Fico gelado nos dedos e maldigo o inverno
Frio, hoje como nunca apenas no coração
Consinto esse frio visível e sem disfarce,
Durmo com um punhal na nuca, queima
Quando me toca na face, lembra a morte
Não de todo negra, mas cinzenta pouco
Clara, como a sorte ou o sentir do beijo
Na aragem, é como a paixão, não se demora,
Mal me acontece estar triste, penso nela,
Tenho logo outra razão pra contrariar
Isso, estou triste porque existo pra fora,
Melhor não há, viver não é ruim, assim
Amo as coisas simples, o vinho tinto,
Dois seios, o pão, o cantar do galo,
O sorriso dela, o alecrim, o agasalho, um gato
No inverno, o sorriso meu, uma vela,
Um saguão e a escada e o fim do livro lido em
Vão, quanto o final de um sonho mau ou
Nada mais que meu, que a sensação de tê-lo
Sonhado, a meio sono como é hábito e em
Forma de pensamento e tacto, algo como se fosse
Outro sentido, quinto ou primeiro, em alta voz,
Falando comigo em Braille, como sempre faço.



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Joel Matos (Março 2020)

Daniel Faria, excerto “Do que era certo”





Excerto “Do que era certo”
I
Nesta adiantada etapa ou quartel da minha vida, não deveria acreditar já, nem “por’í-além” em coincidências, mas por lado contrário ainda aumentam e em muito, as minhas expectativas mundanas acerca dos acontecimentos que não conseguia nem consigo, plácida e pacificamente explicar, o método e o conteúdo exótico dos mesmos.
O dia terminava quente e na ligeira aragem fresca que se fazia sentir no rosto e na pele dos ombros nus, um remédio que cura e que ao mesmo tempo me saudava os sentidos como numa saudação cósmica benigna e universal, tal o poder que sentia em mim vindo e direccionado da natureza, um auspicioso bem estar oriundo e inscrito no espaço envolvente e sentido em uníssono com a mente e o corpo. A caminho da serra sentia-se cheiro a pinheiro bravo e aquele perfume a flores silvestres contagiante e inseparável da pele, de uma fragância libertadora, como uma bênção extraída da natureza comunicando aos poros o aval, a permissão de viver que todos os dias necessitava tal como um afrodisíaco, para voltar a dar vida à vida e poder eu continuar correndo e andando pelos trilhos da montanha aberta.
Como é próprio da minha delicada e dedicada imaginação construo apocalipses e maremotos em chávenas de café mais ou menos morno, a falta de explicação de certos fenómenos iliba-me de os comprovar (excepto no generoso aroma do café) e não contesto, jamais contesto o meu voluntarioso espírito acerca da veracidade crua e volátil dos factos, trato de os preservar como num cadinho para, no futuro (digo sempre “no futuro”) os desencantar num outro universo paralelo em que façam mais sentido e encaixem magicamente, como se fossem peças de um grande puzzle.
Daniel Faria era para mim um nome mágico, pertencia a um jovem e raro poeta, monge noviço, falecido pouco tempo antes e de uma forma misteriosa, para não dizer suspeitosa e pouco esclarecida, no claustro de um convento escondido ao norte do país, Singeverg, em S. Martinho de Cucujães, uma ancestral e secreta congregação Beneditina, este sempre me tinha fascinado e não só pela escrita poética, mas não imaginava eu que, nas minha deambulações reais e com os pés e cóccix bem assentes sobre as pernas cruzadas, num chão de terra batida, o seu nome fosse pronunciado de uma forma tão real, esclarecida e clara embora com voz rouca de um sem abrigo ou eremita com que me fui acostumando a conviver na serra, ao longo de dias e meses de conversas interessantes e inteligentes acerca do tudo e do nada das coisas da vida e naturalmente da morte.
Não resisti, dificilmente resisto a partilhar perante todos e o mundo, além das minhas fontes, (verdadeiras ou falsas) o inicio e o móbil dos meus romances, tal como desta vez. Daniel Faria morreu auspiciosamente no dia do meu aniversário, o trigésimo terceiro, a pretensa idade de Cristo ao morrer e daí talvez, eu sentir uma atração compulsiva, assim por exemplo como pelo irmão Jorge S. de Fernando Pessoa, ou por Ernest Hemingway que se suicidou no mesmo dia e aparentemente à mesma hora (tratei de averiguar) em que dei o primeiro berro, a minha primeira madrugada a quatro, cinco ou talvez a dez dimensões, o Big-Bang.
Mas continuando, acerca de Daniel Faria e das revelações que dia a dia me iam sendo anunciadas por D. Bernardo de Roriz, de quem somente e ao fim de meses de restrita relação de humildade de confessionário e comunhão chegaria a saber o nome e o cargo do cónego principal do convento onde faleceu o poeta aos 27 anos de idade, segundo o qual “o olhar dos anjos tanto perturbava”.
Decidi naquele dia em que o conhecera, fazer um trajecto menos comum na montanha e percorrer esse antigo caminho que se desviava pela esquerda do principal e ficado sempre e sempre por realizar, desolado e muito abandonado, tapado por erva abundante e alta, embora tivesse já servido de via de comunicação entre algumas capelas solitárias e semi desmoronadas era um mundo mítico e aparte, coberto das memorias no musgo e dos fetos da altura de um homem, um mundo organicamente puro, sub-humano e deslocado, de tranquilidade inominável, aparentemente fora desta dimensão.
II
Numa sinceridade quase catedrática e omnisciente em que a proporcionalidade de estímulo da minha parte não excedia a determinação daquela vontade benigna e franciscana em revelar conjuras e conspirações diletantes, minhas pupilas aumentavam e diminuíam, na medida que sentia presente o som das passadas pelos claustros da basílica e as orações dos padres, estranhamente repercutidas nos arcos das ogivas centenárias. Austero nas palavras mas impetuoso, o frade congregava a minha atenção como se fosse uma novela em várias temporadas e todo o tempo do mundo fosse pouco para que terminasse o enredo, nem eu o desejava. Não faltava ao encontro, sempre e religiosamente à mesma hora, levava-lhe um pão, vinho e alguns alimentos que ele colocava de lado e num cerimonial, dir-se-ia japónico, transladava da memoria um Daniel com detalhes vividos em contornos de vitral, como só eclesiásticos sabem transmitir.
Em primeiro lugar confessou-me o facto de Daniel não ter morrido acidentalmente e não poder levar esse segredo com ele até à sepultura, visto ser a única testemunha dum homicídio perpetuado hediondamente por membros da mesma congregação religiosa e monástica que dirigira abnegadamente durante décadas.
(continuará)

domingo, 1 de março de 2020

A síndrome de Savanah








A síndrome de Savanah
Se falasse, crítica, enfática e demoradamente com o meu anfitrião e Alter-Ego, diria como diz Chico Buarque, “O meu caro amigo me perdoe, por favor”, pois sinto que não lhe faço uma visita tão afável quanto as que este me concede, mas não é, nem são práticas comuns a mim, nem a cortesia gratificada nem a indelicadeza gratuita, pedante e desgovernada, é preciso compreensão, pois que, qualquer criança, mesmo de recente idade e começo na fase anal já possui um ego alterado, se é que me faço entender por escrito, tal o meu promíscuo complexo de inferioridade.
Meu caro e dilecto amigo, se é que o posso afirmar sem receios, eu bem tento ser convincente nas inquietas afirmações que produzo, mas também te afirmo, afianço que, revoltas nuvens e aos magotes, nem são sinal de tempestade perdurável, nem a acção de uma toalha no ringue é o sinal melodramático para abrir fogo ou um espaço entre gotas de chuva enviesada e grossa. São tudo citações artificiais e exteriores a mim que proponho, assim como a pele sintética de comparação a parafina no toque dum manequim de modo a ser mais humano pelo menos na aparência daquilo que projecta à luz da montra de uma superfície comercial, se é que me faço semanticamente entender.
Quando a pradaria está insuportavelmente deserta abro a janela na esperança do “absolutamente tranquilo” dê ordens ao barulho longínquo da pistola para que quebre o silêncio de ”morte estabelecida por decreto”, a síndrome da savana cria-se a si própria e é de uma inspiração criativa ímpar, quando nos damos conta entra-nos pelos sentidos e potencia-nos quase religiosamente a criar tal como um caprichoso, maduro e super-produtivo Picasso da Mongólia Interior, esquecei Crime e Castigo e Dostoievski .
Meu caro amigo, me perdoe a demora, mas analisando retrospectivamente a atmosfera pouco romântica do nosso passado pouco comum, teimo em concluir que um casamento demasiado, juvenil, precipitado e a consumação do matrimónio à pressa num motel de estrada não calha nada bem para ambos os cônjuges, sendo vantajosa uma união sadia e ponderada, tardia e talvez menos intensa e fogosa, mas imensamente mais séria e quiçá até ao fim da existência de ambos, e é essa a minha suprema ambição conjugal. Enfim, acho que pegaste a essência, certo?
Uma direcção, um foco, a escrita sinestésica e estética como criação optimizada, artística e sem o defeito dos esteróides do meu altEr-EgO,” O-duplO-Eu”, melhor que Eu, sem pressões, este toca bateria e guitarra numa banda alternativa tailandesa de “Post-Rock”, dialoga em mandarim com ledores e editores sem os magoar nas feridas sanguíneas, nas megas feiras do livro, ele sim, é um ser fascinante, ao contrário de mim, o fracassado, o parente absolutamente tranquilo, o lobo habitante das estepes, onde não se passa totalmente nada, apenas quando me ultrapassa um galgo no pó do caminho, quando tento por gestos me aproximar gago, do espelho e estabelecer um diálogo, ou dando ordens aos barulhos longínquos de pistoleiros disparando ao acaso para os ares ou uns contra os outros, como preferis ou for mais romântico e não o mais parcimonioso.
Então aqui vai o cardápio em germânico, do evento gesticulado ou o menu da ceia para os próximos cento e tal anos de solidão contigo, em que nenhum vento será favorável à nossa imortalidade de gregos, “génios” nem gritam pelos nossos nomes ou consolo, as velas, nem nos estandartes, candelabros com costuras diagonais malignas, digamos da guerra – tronga – e longa, entre aborrecidas e monótonas máquinas de escrever cibernéticas, na estação do «ninguém te provoca, nada te implica», ruído branco…
(……)
Generosos e sensatos foram os nossos bis, tetra-avôs e avós, quais nos ensinaram a manter uma calma resiliente, mesmo sob ventos devastadores e desgastantes guerras punitivas, etc,. Retribuamos agora o aceno, sob um ponto de vista de intolerantes aditivos, instáveis auditivos que apenas gesticulam enquanto tomam cachaça da forte ou café puro, juntos se este for da costa Arábica/Leste, saibamos que não controlamos as nossas emoções primárias quanto eles, estes nossos antepassados nobres, embora possuamos uma e a mesma raiz evolutiva, partilhemos uma génese gramatical bi-decimal e em decibéis audíveis, onde não consta qualquer referência a armas de fogo ou à “síndrome de tranquilidade da savana”, entretanto vou ordenar aos pistoleiros que se digladiem em combate fratricida, olho por olho, mano a mano contra a força gravitacional duma Terra previamente enterrada e convenientemente morta, absolutamente tranquila.
Assunto fechado, encerrado, finito, pois o gato preto macho residente, pede insistentemente que lhe descerre a porta de fora, talvez devido a alguma oportuna e preliminar dor intestinal ou na bexiga do “gatesco” felino a dar horas bem precisas, quando se acumula o chichi junto à próstata, como se fossem dados acumulados a dar de fora na cache do ordenador onde escrevo sem parar faz horas, sei lá, a respeito do estranho tempo que faz lá fora, sem que nos inflija cá dentro dessa terrível coisa que se chama viver, que a minha avó experimentava 24 horas por dia, quando estava viva e a vida era agradável de viver, constipada e fora de portas…
Passei do ponto em que passam a não ter conto os disparates em ponto cruz e chega a altura que começo a inventar símbolos pontuais, como saídos de Sinestesicos bolsos, saldos em formas anatómicas e autónomas de pensamento de infinitas ligações e sugestões quais ainda não havia chegado a vez de desocuparem as algibeiras do casaco, julgava eu cosidas em pospontos, mas já prontas a entrar em palco, e espreitando pela greta do pano de cena em Marron/Grená…(até já)


http://joel-matos.blogspot.com/
Joel Matos (Dez 2019
)

quarta-feira, 8 de janeiro de 2020

Patchwork...







Neo-Expressionism in Iranian Contemporary Art





Nunca senti tanta e tamanha antipatia
Pelo papel canelado e pelo patchwork
Consistente do plano, conservador
Este que transforma o bílis da vesícula

Em acto sentimental aos piedosos atrevidos,
Inspectores da mente pra quem tudo é quebrado,
Antigo, descrente descontinuado, carente sexual
Ou até mesmo dissidente quanto um sarcófago.

Se na vida pudesse crer-me existente e real,
Duvidaria que no mundo existisse vida assim,
Pois tive agora mesmo,
De rompante a sensação que não há lá fora nada,

Nada existe fora de mim que valha a pena ser vivido,
Por isso vivo por dentro o que posso viver sem mesmo,
Como se fosse eu o único ser vivo desse mundo sem vida,
Sem gente, que nem sei se existe ao certo,

Nem dentro de mim de peito aberto cabe,
Não creio nem é do meu credo, odeio
Acreditar pleno em nada, nem haver no mundo
Uma Paisagem tão árida, tão em ferida funda e frouxa,

Tão temida pelo vento tão gélida e negra,
Quanto esta minha antipatia
Plana, mecânica quanto o papelão canelado,
Inexistente sem Patchwork.






Jorge Santos 01/2020
http://namastibetpoems.blogspot.com

Vivo do oficio das paixões







Vivo no ofício das paixões,

É ao entardecer que me julgo mais distante e pando,
Não há lá nem cá, nem cá estou, menos estou lá, sempre
Estou onde me penso mesmo, não por estar pensando,
Mas porque me lembro ao pensar, do que sei e sei sendo

Esse pensamento, como sendo de ninguém daqui, nem d'além
Tampouco, esse alguém que passou pra outro lado, passado,
Fumo, vantagem de uns poucos o pensar futuro, sentir nova
A quinta-dimensão, rápida a mudança de via interrupta para afiada,

Vêm visões sem conteúdo do outro lado, subvertidas,
Amotinadas, despenteadas eclusas de díspares destinos,
Anseio por instantes sem importância alguma, mas não
Que venham sentar-se comigo à terça, numa cadeira

Desdobrável, dessas de praia em verga, eu espetando alfinetes
De Vudu no entendimento, a função de todo o cabalista
É excluir tudo o que sabe para sentir que entender bem fundo
Sem ver o que está pra aquém e colide com o saber fundado,

A reclusão do conhecimento aprendido, como nos falaram
E que iria gerar um mundo novo, ornamentado a cores
De feira, vindo sentar-se ao domingo na missa, precisamente
Às nove e meia de um amanhecer que sempre seria brando,

Vivo na periferia de tudo isto e de tudo o que me liga
Ao real, vivo no oficio das paixões, gozo-as como se fosse
A transmutação de outro mundo em ouro com que se veste
A minha alma ou a inexistência dela, da razão de entardecer

Dos dias, os sentidos não só sentem, também entendem
O que afirmo e me excede apesar de apenas ver com o espírito
E ter perdido todos os outros sentidos, sinto-me medonho,
Como se fosse místico devoto a um Demogorgon da Babilónia.


















Jorge Santos 12/2019
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Como morre um Rei de palha...






De futilidades e empatias tenho a aorta cheia,
Mas quando o céu morre e o frio se torna cinza,
Cai em mim um véu, que é mais magro que o cio
E do que o altar vazio - o mote de acabar o dia -

Se pudesse retiraria o coração amanhã e pela frente,
Para de repente, voltar a ser gente que nem fui,
Foi-me retirado pelas costas, por ironia e pela
Folha de um punhal estranho, de ferrolho velho,

Virei depois saldar as minhas dívidas de jogo,
Desde as bem maiores às mais mínimas,
Que a fé na sorte faz esquecer, Orixá me perdoe,
Pois nem outro vício tenho, jogo de manhã,

Até à calada da noite, amanhã cedo não haverá magia,
Nem nos reconhecermos, tampouco nos perceberemos,
Somos simples corações humanos, postumamente
Criados por um Senhor morto sem pressa,

Com a clarividência de um Sultão da Pérsia nado-morto,
Deposto pela simpatia de um fraco e gordo, inútil
Até ao sobrolho e sobre ele todo, disse-me que morrerei
Só, que é como morre um rei de palha, em pó...






Jorge Santos 12/2019
http://namastibetpoems.blogspot.com

Pra lá do crepúsculo

Pra lá do crepúsculo Deixei de ser aquele que esperava, Pra ser outro’quele que s’perando Em espera se converteu, alternando Despojo com eng...