quinta-feira, 24 de outubro de 2013

Pudesse eu...


Pudesse eu, não ter laços
Ou esperança,
Cair no poço sem fundo,
Com que sonhava em criança,

Pudesse eu, na garganta sentir,
Torturante,
A dor no parir, perto ou distante
E o choro aflito dos qu’hão-de vir.

Pudesse eu, fazer
-“O que me dá na gana”,
Não morreria numa cama,
Escolheria viver enterrado,

Sentindo o peso da terra,
Amontoada na tumba,
E os caniços, varando-me a cara nua,
Numa sensação boa,

Pudesse decepar eu, os braços
E salvar a dor
Na alma,
Não seria estranha,

A sensação tamanha de sentir,
Que deveras sinto…

Joel Matos (10/2013)

segunda-feira, 1 de abril de 2013

(Na cidade fantasma que é o meu pensamento)




O meu pensamento é uma cidade fantasma,
Ruas suspensas, submissas ao tempo, ruínas de templos
E os gemidos dentro das casas, (acaso possuíssem alma)
Seriam ténues, não me prendessem tatuagens nos braços

Nas frases austeras que um esquecido astrólogo segreda
Ao meu pensamento. É uma cicatriz que dói, aberta
Quando se remove com a unha, pra não ficar dedada.
O manto da invisibilidade é a sua cómoda coberta,

A manta de lenços e papel que absorve qual mata-borrão
(Fico sem saber se é natureza murcha ou decalque da morte)
E depois me atira ao acaso, nessa cidade de casas sem chão,
Fixas no ar, vazias de tudo, como absurdas obras de arte.

O inesperado e talentoso verso pode nem surgir nele,
Como por encanto, mas por enquanto, vai alternando
Entre ouvir-me e surpreender-se a si próprio, do seu pensar
Estranho. Às vezes tenho pena de quem não imagina, tendo

Eu, nas mudanças de rumo deste pensar, a visão máxima
De assombro, quando dou por mim no fim, a voar sobre campos
Que não sabia existir no inicio e a cidade se alastra e o tema
É o poema e ele se transforma, na casa dos meus sonhos,

(Na cidade fantasma que é  o meu pensamento)


Joel matos (04/2013)

terça-feira, 19 de março de 2013

Vivesse eu na paz dos imortais




Vivesse eu na paz dos imortais

Tivesse eu, fé nos lábios meus, quando escrevo
E majestade nos dedos; resgataria o frenesi
Cativo nos frutos da paixão, tornaria servo
O aroma do azul motim e o esplendor da relva no jardim
Tivesse eu, a fé de recheio em mim, como um ovo,

Que nem humildes nuvens me suspendem os beiços,
Como posso sentir, o sentir de Deus, em “technicolor”
E alterar o pão em vinho se depois, reparto pedras, teixos
E amostras sem valor de poemas “multiflavor”.
Antes que os medos e o receio me vençam, quero ter dedos,

Como se falassem a Deus, na fala de Prometeu. Se s’crevo,
O que não diria eu, sendo dele, pra’além d’afiançar
Ser sentido, apesar de não ser real, o meu canceroso acervo.
Vivesse eu, na paz que os imortais assumiam como seu samsara
E pudessem minhas mãos florescer, na estação do novo,

Teria eu, fé nos lábios meus, enquanto soberano
E poderia ter ameias de plácidos castelos, nos rombos dedos.
Vivo eu no contraditório dos normais,
Sou desconhecido nesse paradeiro e meu dom,
Habita escondido, sem o saber, no coração dos imortais…

Joel matos (03/2013)

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

Poema Con-Dom


No meu reino soberano,
Literal e literário,
Vivo danado e mundano.
Apesar de não cometer adultério,

Sou moralmente insubmisso
Ao casamento, como ofício
Santo, casto e excelso.
A minha fé é lei e um seio,

E as sedas dos soutiens,
Minhas donzelas e amantes,
Os mamilos…ah, os mamilos
Citrôenes, dois sinetes elegantes.

No meu reino soberano,
A soprano é-o, de coração
E é nela que me venho,
Num peculiar padrão,

Fardado de tenor solteiro,
E patrão do esperma.
No meu reino, sou rei
Do que é ser poema

Liberal e libertário,
Sou o serralho d’um pragano,
Pingo de galheteiro,
Delegado do engano.

O meu mundo não é Terreno,
E mais dia, menos dia, mando
O reino pro aterro,
E demito o Dom…

Joel Matos (02/2013)

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

Houve tempos


Houve tempos em que os sons do celuloide valiam
Mais do que simples palavras, momentos
Em que as imagens saíam do ecrã do cinema
E eu sabia de cor o que diziam os lábios mudos,

As mãos vacilavam, nervosas sob a luz tremula,
Ansiosas pelo toque da companheira do lado,
Suspendia-me na respiração solene dela,
E esquecia o enredo da película que estava vendo,

Na frágil ilusão do filme, esquecíamo-nos da noite,
A vida corria como se fosse uma original edição,
E o que se passava na tela era tão naturalmente aceite
Que orvalhava os olhos e acelerava a pulsação.

Não havia ontem ou amanhã, o tempo esvoaçava,
Espantávamo-nos com a nossa timidez espontânea,
As juras de amor seriam aceites? Saberiam a saliva?
Ou a salva da pastilha-elástica? Sei que provocavam insónia

E repetia tantas vezes o mesmo nome até ficar exausto,
Mas era como se o trouxesse, dentro de mim grudado,
Mesmo depois, quando ficava sozinho no meu quarto,
Recordava os momentos com ela segundo a segundo,

A despedida à porta da sala de cinema, pungente,
Acaso morresse de sede, tendo um rio de agua a porta,
O coração que queria voar, preso por uma corda
À garganta até faltar o ar, a frase não sair autêntica…

Também não eram mais que simples palavras,
O ágil rumor das folhas, nas árvores
A caminho de casa, reclamavam das minhas
Acanhadas frases, saciadas com um beijo na face…

Houve tempos em que me encantava 
por tudo e por nada


Joel Matos (02/2013)

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

Quem


Quem vos deu penas, pra irdes vestidos de trapos,
Quem vos deu o dentro, se não mitigais o desalento,
Quem vos deu cada gota de saliva onde morreis alagados
E nas palavras cruas que vos não saem pelo grito.

Quem vos dissolveu, na vontade das feras mansas,
Quem vos tirou a verdade e a revolta da alma,
Quem vos amarrou, nos cobertores às camas,
E nos rostos das vossas crianças, a solidão estrema.

Quem vos atirou o medo pra gamela,
E a angustia p’la janela do quarto adentro,
Quem vos injuria, como meros cães de palha,  
Se nas batalhas d’antanho vos invocou de guerreiro.

Quem vos roubou a serenidade do olhar,
Quem vos vendeu dos ombros aos artelhos,
Sem permissão para sequer correr, sonhar
Por noites lunares e bondosos amos…

Quem…

Joel_Matos (02/2013)

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

Meca e eu...


O que importa, na espera,
É a presença em falta, severa,
Pesada como um lastro,
Silenciosa como um claustro

A causa do mal todo…
E espero…que importa,
Curvo ou cansado,
Caneta sem tinta,

Cheque careca,
Invisível céu,
Cabala de Meca
E eu…

O que importa,
São as ilusões,
Dando à costa,
Presas aos anzois

E os sonhos, guardanapos
E nos pratos,
Os restos da tua presença,
À mesa.

O que importa,
É que creio,
No que me encanta,
E no que me sorriu,

Até ficar sem fala,
D’ouvir o olhar sorrir…
(Ah…e o falar dela!)


Joel-Matos (02/2013)

Pra lá do crepúsculo

Pra lá do crepúsculo Deixei de ser aquele que esperava, Pra ser outro’quele que s’perando Em espera se converteu, alternando Despojo com eng...